O AVP vai tomar uma posição sobre este tema, mas antes aqui fica um texto do Manuel Pedro (AV1) e a resposta do António da Costa (AV2), publicados no ínicio do AVP, em 2003 e 2005.
O Imposto Taurino Moitense
Finalmente os Moiteiros estão todos de acordo, a tauromaquia é a base de toda a sua cultura local, senão vejamos: A Revista Tauromaquia que no dizer do seu fundador Manuel Filipe é a primeira revista a cores no concelho da Moita feita pelo movimento associativo.
Também nas palavras de Vitor Mendes outro dos fundadores da dita revista: "A cultura taurina na Moita, presentemente está forte e em crescendo.
" O arranque próximo da construção de um monumento de evocação tauromáquica na vila da Moita, terra com um historial rico na tradição taurina, está também nos planos dos mentores de tão louvável iniciativa. O presidente da camâra João Lobo, a tudo tem assistido e incentivado.
O C.T.M. Clube taurino da Moita, pretende legalizar a prática da sorte de varas, que consiste em espetar uma lança no touro multíplas vezes, com o fim de cansar o animal por perca de sangue, para que a força natural do touro seja reduzida de forma que seja mais fácil ao matador de touros o matar na arena.
O cavalo está coberto por uma couraça que lhe proteje todo o corpo, excepto as pernas. Se o cavalo cair é díficil de se levantar devido ao peso da couraça e fica por isso exposto todo o abdomén e peito do animal às cornadas do boi em pontas, como acontece em Espanha.
Morrem bastanres cavalos nas lides de varas, mas concerteza que não serão os cavalos altamente treinados dos cavaleiros tauromáquicos que são extremamente caros. Goya um magistral artista espanhol, fez nos finais do séc XIX uma soberba pintura, bastante elucidativa sobre o que é a sorte de varas. Estão também previstos colóquios sobre " A sorte de varas no contexto legal português ", " O regulamento taurino português " e a " Feira taurina da Moita e as corridas picadas ",ora querem maior aproximação de Portugal a Espanha. A Moita segue na frente da futura união ibérica.
O presidente da junta de freguesia ofereceu a o novilheiro e futuro matador de touros, Luís "Procuna" um modesto capote, mas João Lobo, ilustre Moiteiro, ofereceu um soberbo capote, que não nos poderemos sequer a especular quanto poderia ter custado tal obra de arte e quem a poderá ter executado, confesso desconhecer se existem em Portugal este tipo de artesãos ou se a câmara da Moita o foi comprar a Espanha, quiçá Sevilha, tal obra de arte tauromáquica. Mas a arte não tem preço e os Moiteiros, são do mais aficionado que há neste país à beira mar plantado, e como diz João Lobo "Os sucessos do futuro matador, são triunfos de todos os Moiteiros".
Outras associações do mesmo cariz enobrecem a Moita, como por exemplo: O Grupo Tauromáquico Moitense, A Escola de toureio da Moita que se Deus quiser será a sede da Associação Portuguesa de Escolas de Toureio , A Touro Arte e a Sociedade Moitense de Tauromaquia perdoem se esqueço alguma ... mas a lista é tão grande.
A Moita além de ser vice-presidente ou será já presidente...( Não tenho a certeza...no Jornal da Moita, edição nº 169, diz que a Moita já foi eleita para a sua direcção, mas no Boletim Municipal de 25 de Abril de 2003, diz que é vice presidente. Será ou não será, esta é a questão) ... da secção de Municípios com actividade taurina,da Associação Nacional de Municípios, foi convidada ainda a integrar a Confederação Mundial das Cidades Taurinas.
O que prova que a Moita consegue entrar para uma associação de Cidades quando é apenas uma vila, isto é digno de figurar no Guiness. Naturalmente que com toda esta "afficion" o P.S. da Moita tinha de concordar com a criação do conselho taurino da Moita, como vem expresso no comunicado dos eleitos do P.S. na assembleia Municipal da Moita, que passo a transcrever: "O PS atendendo às tradições centenárias que o povo da vila da Moita tem dedicado à festa brava, de encontrar aqui ( na Moita ) uma das mais prestigiadas praças de touros e feiras taurinas anuais, escola de toureiros etc. deu todo o seu apoio à criação do conselho taurino da Moita"- O Rio nº 135.
Ora parece que os dois principais partidos da Moita, estão de acordo neste ponto, aliás como a esmagadora maioria dos moiteiros. Crie-se pois o conselho taurino da Moita ! Direi mesmo mais, com tantas associações taurinas até se poderiam criar dois ou três conselhos taurinos aqui na Moita !
Mas, os casos como o de Pedrito de Portugal, levam-me a pensar quão pouco é o muito que a Moita tem feito pela tauromaquia... Todos vimos na TV a cara triste de Pedrito de Portugal pelo facto do Tribunal da Moita o ter multado em 100 000 ¤, por ter exercido a sua profissão que é; matador de touros. Claro que em Portugal é ilegal, mas então para que é que existe essa profissão se não se pode exercer.
É como ser pescador Português daqui a alguns anos, quando entrarem os espanhóis nas nossas águas e destruirem todas as espécies de peixes que existem nas águas Portuguesas !
Não é admissivel que Pedrito de Portugal tenha de pagar tão enorme soma de dinheiro ! Foi o povo da Moita do Ribatejo (os moiteiros ) que o incentivou a matar o touro e o carregou em ombros, vitoriando e aprovando assim a sua brilhante "actuação". Por isso eu acho que são os Moiteiros é que devem pagar !
E como ? perguntam os aficionados . Podem enviar donativos para a minha conta pessoal, mas não é só assim que se pode ajudar!
Têm de ser todos os moiteiros, aficionados ou não !
Proponho para isso a instituição do Imposto Taurino da Moita que pode ser cobrado em conjunto coma factura da água e seria apenas mais um acréscimo a somar à taxa de saneamento básico.
Dir me-ão os não aficionados e até os que são contra e acham que a tourada é crime, que não têm nada de contribuir para este imposto !
Não concordo ! Há um caso que me contou um amigo meu; no Poceirão é onde ele vive, cobraram-lhe a taxa de saneamento básico, e ele foi à câmara de Palmela para questionar porque pagaria ele essa taxa se não usufruia desse saneamento básico , dado os esgotos terem sido feitos por ele. Responderam-lhe que era exactamente por isso, que ele apenas pagava 50% e os outros munícipes que tinham esse serviço camarário, esses sim pagavam a totalidade da taxa ! Está aberto o precedente, os moiteiros não aficionados pagarão apenas 50% do Imposto Taurino da Moita a instituir, digo eu.
Pensem nas vantagens de tal imposto... Na altura das largadas, existem sempre casos de acidentes que acontecem nessas largadas, muitas vezes famílias pobres ficam sem algum dos seus membros, ou então alguém é colhido duma maneira que fica incapacitado, também muita gente é vítima de coma alcoólico e postriores curas de desintoxicação, estou-me a lembrar de uma inscrição que vi numa t-shirt que envergava com muito orgulho um jovem moiteiro do clube de aficionados "Drunk Bulls"-Evite a Ressaca, Mantenha-se Bébado.
A tudo isto o Imposto Taurino da Moita poderia acudir !
Poderse-ia também instituir que outros matadores, possam matar touros aqui na Moita e depois o ITdaM* cobria as despesas, que nem seriam grandes, devido ao acréscimo de aficionados e não só, de todo o País e do Mundo que encheriam assim todos os Hoteis e Pousadas da vila da Moita.
Proponho por fim ao Presidente da Camâra, o exímio Dr.João Lobo, agora que o PTP (Partido Taurino Português), está de pedra e cal na Camâra da Moita que se mude o slogan que neste momento já se vê ultrapassado ; "Viver Bem à Beira Tejo", e substituir pelo slogan ; "Matar bem o Boi à Beira Tejo" e também sustituir o Flamingo, que ao que parece anda aborrecido com esta situação e já pouco aparece no Rio, pelo Touro , esse sim bem vivo, e bem dentro de todos os moiteiros. *
...é o Imposto Taurino da Moita...
Manuel Pedro 22 de Novembro de 2003
A resposta (séria) de António da Costa:
Da Tauromaquia na Moita ou a Invenção da Tradição
A leitura do texto do vosso colaborador Manuel Pedro sobre o peso da tradição tauromáquica na Moita e sobre a possibilidade, a meio-caminho entre a seriedade irónica e a paródia séria, de criação de um imposto taurino, trouxe-me à memória uma das teses mais interessantes do historiador inglês Eric Hobsbawn.
Na obra The Invention of Tradition (Cambridge University Press, 1983), Hobsbawn e os outros colaboradores do volume analisam com profundidade o fenómeno conhecido por “tradição” e os processos pelo qual ele é criado ou, em grande parte das situações, forjado. Aquilo que muita vezes se apresenta como tradição identitária de uma região ou grupo humano não passa, afinal, de uma “tradição inventada”, quantas vezes em períodos bem recentes e historicamente bem definidos, e que ao ganhar crescente popularidade por razões conjunturais se vai tomando como uma prática comum de raízes imemoriais ou, no mínimo, seculares.
Vem isto a propósito da pretensa tradição tauromáquica da Moita.
Analisemos a questão com alguma atenção, esquecendo aquelas mitologias que radicam as tradições tauromáquicas lusas nas lutas com touros existentes na antiga ilha de Creta, porque essa é uma linhagem dificilmente demonstrável sem boa dose de imaginação e fantasia.
Em primeiro lugar, a tradição moderna, ou contemporânea, da tourada, tal como a conhecemos, em Portugal – a agora chamada “tourada à antiga portuguesa” – é uma diversão que vê os seus contornos definidos ao longo do século XVIII no contexto das formas de lazer do barroco tardio nacional, com destaque para os reinados de D. João V e D. José. Em praças com estruturas improvisadas e temporárias, as touradas tornam-se divertimento popular e aristocrático em simultâneo, beneficiando das atenções da Família Real quando têm lugar em Lisboa, particularmente defronte do Paço da Ribeira, antes do terramoto de 1755.
Em segundo lugar, as tradições populares locais de ligação de determinadas povoações a manifestações tauromáquicas, mesmo que com episódicas origens anteriores, só se vão cristalizando nos séculos XIX e XX, em contextos regionais relativamente circunscritos ao Ribatejo e a algumas zonas raianas do Alentejo. As “largadas” de touros vão-se tornando populares em momentos de festa, especialmente no Verão, quando as festividades estivais relacionadas com as colheitas se aliam aos festejos católicos evocativos de um(a) ou outro(a) padroeiro(a).
Ora bem, neste contexto, a tradição tauromáquica da Moita dita “do Ribatejo”, por conveniência e necessidade de distinção onomástica de outras Moitas algures, é um exemplo claro de uma tradição inventada para reforçar traços de identidade de uma localidade, de outra forma, sem particulares pergaminhos históricos.
Recordemos que a localidade da Moita é elevada a vila na sequência de um imbróglio legal com os privilégios e mercês de D. Francisco de Távora, sendo os seus limites e prorrogativas definidos na sequência de irregularidades várias que suscitaram à época acesa polémica (consulte-se a documentação constante na obra Moita – Vila há 300 anos publicada pela CMM, para comprovar o que se afirma). Então, como durante os 150 anos seguintes, a Moita era uma localidade de importância reduzida que, só pelas circunstâncias referidas, se emancipou do concelho de Alhos Vedros, com população e recursos escassos. O poder da Moita e os esforços para a criação de uma identidade própria só ganham verdadeira dimensão numa segunda fase do regime liberal, nas últimas décadas do século XIX, quando os rearranjos dos limites municipais são feitos ao sabor das conveniências eleitorais dos partidos do chamado Rotativismo e o mapa dos concelhos é delineado com base no interesse dos caciques locais.
No século XX, em especial durante o Estado Novo, a Moita consolida a mitologia da sua pretensa tradição ancestral. Esse é um período em que, um pouco por todo o país, a “tradição” é (re)inventada, tão ao gosto da ideologia salazarista que produziu a Exposição do Mundo Português. Todo o país é recoberto de pelourinhos, tristes simulacros dos genuínos, medievais ou manuelinos (como o de Alhos Vedros). A Moita ganha então o seu pelourinho, arrogando-se de um símbolo de um poder municipal sem verdadeira tradição.
É altura da fixação dos brasões municipais, da construção das obras emblemáticas das aldeias e vilas, que se pretendem as mais portuguesas de Portugal. Rasgam-se novas artérias, erguem-se as edificações mais representativas do período.
Na Moita, é o tempo da renovação da chamada “Avenida” (é mais uma alameda, mas...) a subir para o seu ponto alto – a Praça de Touros !!!
Outras terras organizam as suas artérias em função dos Paços do Concelho, da Igreja Matriz, do Tribunal. Alhos Vedros, por imposição urbanística do ilustre Presidente da Câmara moitense Vitor de Sousa viu a sua nova Avenida Bela Rosa travada e fechada pela Escola Primária. Pelo menos, e apesar de tudo, esse é um símbolo da Educação.
A Moita não ! Escolheu para topo da sua artéria mais representativa desses tempos uma Praça de Touros e arregimentou-se ao lote das terras que se arrogam de tradições tauromáquicas, sublinhando o facto de ser Moita “do Ribatejo”. A explicação da origem de tal topónimo é mais do que nebulosa. A linhagem no velho concelho ou terra do “Riba-Tejo”, dos séculos XII e XIII, é mais do que difícil, porque então a Moita era um aglomerado com meia dúzia de casotas e quintas. A ligação ao actual Ribatejo, e às tradições taurinas, é o exemplo mais acabado de uma tradição inventada, sem qualquer fundamentação razoável.
A tradição taurina da Moita é um gosto relativamente recente e, mais do que identidade, é como um desejo de ser outra coisa, diferente do que aquilo que se é. Se terras próximas, como a Aldeia Galega/Montijo ou até Alcochete tiveram durante muito tempo uma importante componente económica na pecuária, na criação de gado, que as liga um pouco aos costumes das planícies e lezírias do Tejo mais a montante, a Moita não é recordada por tal actividade.
Por outro lado, gostava de conhecer a fundamentação documental da antiguidade de tal tradição taurina que justifique o empenho que agora se demonstra na promoção e apoio a esta actividade, desde o poder autárquico (longe vão os tempos em que as touradas eram tidas como manifestações de conservadorismo reaccionário pela inteligentsia de esquerda) à imprensa local (vejam-se os frequentes encómios a qualquer iniciativa tauromáquica no Jornal da Moita ou mesmo a declaração de intenções manifestada em editorial recente de O Rio).
Não tenho nada contra a promoção da tauromaquia como ex-libris da Moita, mas com a condição de que esse é um símbolo da Moita, e não do seu concelho (terras com história bem mais antiga como Alhos Vedros ou o Barreiro, que pertenceram longamente à mesma unidade administrativa, não recordam tal passado). E, para finalizar, que essa promoção não seja feita à custa do forjar de uma memória histórica inexistente ou, pelo menos, bem diversa da que se pretende apresentar como legitimadora da tauromaquia como actividade maior do concelho, o qual é um todo e não apenas uma parte, mesmo que transitoriamente a sua sede.
A leitura do texto do vosso colaborador Manuel Pedro sobre o peso da tradição tauromáquica na Moita e sobre a possibilidade, a meio-caminho entre a seriedade irónica e a paródia séria, de criação de um imposto taurino, trouxe-me à memória uma das teses mais interessantes do historiador inglês Eric Hobsbawn.
Na obra The Invention of Tradition (Cambridge University Press, 1983), Hobsbawn e os outros colaboradores do volume analisam com profundidade o fenómeno conhecido por “tradição” e os processos pelo qual ele é criado ou, em grande parte das situações, forjado. Aquilo que muita vezes se apresenta como tradição identitária de uma região ou grupo humano não passa, afinal, de uma “tradição inventada”, quantas vezes em períodos bem recentes e historicamente bem definidos, e que ao ganhar crescente popularidade por razões conjunturais se vai tomando como uma prática comum de raízes imemoriais ou, no mínimo, seculares.
Vem isto a propósito da pretensa tradição tauromáquica da Moita.
Analisemos a questão com alguma atenção, esquecendo aquelas mitologias que radicam as tradições tauromáquicas lusas nas lutas com touros existentes na antiga ilha de Creta, porque essa é uma linhagem dificilmente demonstrável sem boa dose de imaginação e fantasia.
Em primeiro lugar, a tradição moderna, ou contemporânea, da tourada, tal como a conhecemos, em Portugal – a agora chamada “tourada à antiga portuguesa” – é uma diversão que vê os seus contornos definidos ao longo do século XVIII no contexto das formas de lazer do barroco tardio nacional, com destaque para os reinados de D. João V e D. José. Em praças com estruturas improvisadas e temporárias, as touradas tornam-se divertimento popular e aristocrático em simultâneo, beneficiando das atenções da Família Real quando têm lugar em Lisboa, particularmente defronte do Paço da Ribeira, antes do terramoto de 1755.
Em segundo lugar, as tradições populares locais de ligação de determinadas povoações a manifestações tauromáquicas, mesmo que com episódicas origens anteriores, só se vão cristalizando nos séculos XIX e XX, em contextos regionais relativamente circunscritos ao Ribatejo e a algumas zonas raianas do Alentejo. As “largadas” de touros vão-se tornando populares em momentos de festa, especialmente no Verão, quando as festividades estivais relacionadas com as colheitas se aliam aos festejos católicos evocativos de um(a) ou outro(a) padroeiro(a).
Ora bem, neste contexto, a tradição tauromáquica da Moita dita “do Ribatejo”, por conveniência e necessidade de distinção onomástica de outras Moitas algures, é um exemplo claro de uma tradição inventada para reforçar traços de identidade de uma localidade, de outra forma, sem particulares pergaminhos históricos.
Recordemos que a localidade da Moita é elevada a vila na sequência de um imbróglio legal com os privilégios e mercês de D. Francisco de Távora, sendo os seus limites e prorrogativas definidos na sequência de irregularidades várias que suscitaram à época acesa polémica (consulte-se a documentação constante na obra Moita – Vila há 300 anos publicada pela CMM, para comprovar o que se afirma). Então, como durante os 150 anos seguintes, a Moita era uma localidade de importância reduzida que, só pelas circunstâncias referidas, se emancipou do concelho de Alhos Vedros, com população e recursos escassos. O poder da Moita e os esforços para a criação de uma identidade própria só ganham verdadeira dimensão numa segunda fase do regime liberal, nas últimas décadas do século XIX, quando os rearranjos dos limites municipais são feitos ao sabor das conveniências eleitorais dos partidos do chamado Rotativismo e o mapa dos concelhos é delineado com base no interesse dos caciques locais.
No século XX, em especial durante o Estado Novo, a Moita consolida a mitologia da sua pretensa tradição ancestral. Esse é um período em que, um pouco por todo o país, a “tradição” é (re)inventada, tão ao gosto da ideologia salazarista que produziu a Exposição do Mundo Português. Todo o país é recoberto de pelourinhos, tristes simulacros dos genuínos, medievais ou manuelinos (como o de Alhos Vedros). A Moita ganha então o seu pelourinho, arrogando-se de um símbolo de um poder municipal sem verdadeira tradição.
É altura da fixação dos brasões municipais, da construção das obras emblemáticas das aldeias e vilas, que se pretendem as mais portuguesas de Portugal. Rasgam-se novas artérias, erguem-se as edificações mais representativas do período.
Na Moita, é o tempo da renovação da chamada “Avenida” (é mais uma alameda, mas...) a subir para o seu ponto alto – a Praça de Touros !!!
Outras terras organizam as suas artérias em função dos Paços do Concelho, da Igreja Matriz, do Tribunal. Alhos Vedros, por imposição urbanística do ilustre Presidente da Câmara moitense Vitor de Sousa viu a sua nova Avenida Bela Rosa travada e fechada pela Escola Primária. Pelo menos, e apesar de tudo, esse é um símbolo da Educação.
A Moita não ! Escolheu para topo da sua artéria mais representativa desses tempos uma Praça de Touros e arregimentou-se ao lote das terras que se arrogam de tradições tauromáquicas, sublinhando o facto de ser Moita “do Ribatejo”. A explicação da origem de tal topónimo é mais do que nebulosa. A linhagem no velho concelho ou terra do “Riba-Tejo”, dos séculos XII e XIII, é mais do que difícil, porque então a Moita era um aglomerado com meia dúzia de casotas e quintas. A ligação ao actual Ribatejo, e às tradições taurinas, é o exemplo mais acabado de uma tradição inventada, sem qualquer fundamentação razoável.
A tradição taurina da Moita é um gosto relativamente recente e, mais do que identidade, é como um desejo de ser outra coisa, diferente do que aquilo que se é. Se terras próximas, como a Aldeia Galega/Montijo ou até Alcochete tiveram durante muito tempo uma importante componente económica na pecuária, na criação de gado, que as liga um pouco aos costumes das planícies e lezírias do Tejo mais a montante, a Moita não é recordada por tal actividade.
Por outro lado, gostava de conhecer a fundamentação documental da antiguidade de tal tradição taurina que justifique o empenho que agora se demonstra na promoção e apoio a esta actividade, desde o poder autárquico (longe vão os tempos em que as touradas eram tidas como manifestações de conservadorismo reaccionário pela inteligentsia de esquerda) à imprensa local (vejam-se os frequentes encómios a qualquer iniciativa tauromáquica no Jornal da Moita ou mesmo a declaração de intenções manifestada em editorial recente de O Rio).
Não tenho nada contra a promoção da tauromaquia como ex-libris da Moita, mas com a condição de que esse é um símbolo da Moita, e não do seu concelho (terras com história bem mais antiga como Alhos Vedros ou o Barreiro, que pertenceram longamente à mesma unidade administrativa, não recordam tal passado). E, para finalizar, que essa promoção não seja feita à custa do forjar de uma memória histórica inexistente ou, pelo menos, bem diversa da que se pretende apresentar como legitimadora da tauromaquia como actividade maior do concelho, o qual é um todo e não apenas uma parte, mesmo que transitoriamente a sua sede.
AV1, então assinando-se como António da Costa
1 comentário:
E o mais engraçado (que não tem graça) é que na Assembleia Municipal de dia 29 de Junho vão conseguir votos para isso.
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