Hoje sinto-me profundo, deve ser do Agosto frescal, pelo que me digno partilhar convosco uma reflexão política digna de um Manuel Pedro ou um António da Costa.
No modelo europeu ocidental do Estado-Providência, todos devem participar com a sua quota-parte para o esforço do Estado em assegurar as suas funções.
Em termos ideais, o modelo redistributivo baseia-se em que os indvíduos, empresas, etc, com mais meios contribuam mais, para assegurar que os que têm menos recebam a ajuda de que necessitam.
Em Portugal existe um modelo alternativo; os que têm pouco contribuem todos para que a redistribuição se faça para os que têm mais, sejam os que fazem grandes negócios com o Estado, sejam aquelas empresas que nunca dão lucros, mas funcionam anos a fio, permitindo visível prosperidade aos seus proprietários.
Porque se passa isto assim ?
Porque após os curtos anos revolucionários em que o chamado «grande capital» foi afastado, se seguiu um longo processo em que aqueles que se opuseram (vitoriosamente) contra a tomada do poder pelas facções marxistas estatizantes se dedicaram a um longo namoro no sentido de fazerem esse grande capital regressar.
Nos últimos 20 anos, mais coisa menos coisa, interesse políticos e económicos emaranharam-se de tal forma que é difícil desmanchar o nó. Os políticos dos partidos à direita do PC entretiveram-se a tentar atrair para seu proveito os dinheiros dos interesses económicos privados sob a promessa de, conquistado o poder, retribuirem com vantagens concorrenciais ou, mais prosaicamente, com o dinheiro do Estado.
A formação dos imberbes grupos económicos nacionais actuais passou quase sempre por este processo.
Os interesses económicos apostam em determinados grupos ou indivíduos para conquistarem o poder político (principalmente nos partidos centrais da nossa democracia, PS e PSD) e depois, quando ele é conquistado rotativamente, a retribuição fica na ordem do dia. O equilíbrio só é ameaçado quando uma determinada facção exagera no desmando ou no tempo em que controla o poder (foi o caso da década cavaquista).
Por isso, Portugal é dificilmente governável, seja a nível nacional ou local.
O problema não está necessariamente nos portugueses, em geral, por serem preguiçosos, pouco produtivos, pouco empenhado numa ética do trabalho ou com má formação (profissional, cultural, etc). Embora isso seja parte do problema, não é todo, ou mesmo o essencial, do problema.
O pior deve-se à ganância das elites que se consideram no direito de dominar o aparato estatal em seu proveito e no daqueles que os conduziram ao poder, via financiamentos chorudos para campanhas eleitorais e outros mimos.
Claro que é isso que impede uma reforma do sistema político a começar pelo financiamento dos partidos e pelos limites de despesas das campanhas.
Em nome da liberdade, movem-se interesses que, a existirem esses limites, perderiam margem de manobra.
Claro que, em primeiroa e última instância, os maiores culpados são os políticos que em vez de dedicação à coisa pública se movem por interesses privados, pessoais, em que o exercício do poder político apenas funciona como meio para atingir objectivos mais elevados.
Um exemplo paradigmático desta atitude, deste estar e depois não estar, estando, na política, é o de Dias Loureiro, bem respaldado nos dividendos da sua actividade privada, conseguida graças aos 10 anos de estadia no poder político, que agora se esquiva ao exercício de cargos executivos mas que não foge a manobrar nos bastidores aqueles que, a seu mando e graças à sua influência, são colocados em postos-chave da governação.
Ao contrário do que dizem alguns, mesmo que com boas intenções, os cargos políticos não são mal remunerados pois essa remuneração, desde a sua criação na Atenas do século V a. C., se destinava apenas a compensar minimamente quem servia o interesse público e não tinha outros meios de subsistência e não a compensar eventuais perdas de rendimentos mais elevados.
Não percebo que um ministro se sinta mal ao ganhar menos do que um gestor de uma empresa, pois a sua posição e autoridade não deve residir na sua capacidade económica mas na dignidade da sua função e da sua acção. E o problema está aí, muitas vezes o exercício das funções públicas é feito de forma indigna por aqueles quie as encaram como mero trampolim no seu currículo, como etapa necessária para conhecer os meandros do aparelho estatal que permitirá, mais tarde, colher dividendos.
O percurso tipo deste género (menoríssimo) de político é o seguinte: até aos vintes dar nas vistas nas jotas, gritando até chegar a ser alguém numa Associação de Estudantes, escrevendo artigos inflamados na imprensa partidária ou local e exercendo cargos locais/regionais de relevo discutível; até aos trintas conseguir um posto de chefia intermédia na estrutura partidária nacional, ascendendo a deputado, assessor ou (sub)secretário de Estado nos casos mais afortunados; aos quarentas chegar a administrador de empresa com participação no Estado ou ministro e, no fim dos quarenta, estar já em posição de viver dos rendimentos, depois de ser chamado para cargo bem pago num grupo económico privado, acidentalmente bafejado pela sorte na sequência da sua acção política.
Assim se constrói uma figura política respeitável de sucesso.
O passo seguinte é passar a ser comentador residente na SIC-Notícias ou no noticiário da noite de um dos canais generalistas, ganhando o estatuto de reserva moral da Nação.
Assim se (nunca) constrói um Portugal de sucesso.
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