Sei que faça o que fizer, serei obrigado a dar a TM a última palavra pois, caso contrário, ele continuará sempre a desafiar-nos a paciência.
O seu último texto fez com que perdesse a vontade lhe explicar algumas coisas básicas que, no fundo, ele saberá mas que por questões de estratégia política faz por ignorar.
TM parece confundir estridência (daí aqueles textos com maiúsculas a substituir o volume da voz) com veemência. Os desafios para a arena de luta – os constantes ziguezagues acusatórios quanto à nossa e minha afinidade partidária, as provocações quanto à identidade, etc, etc – são um pouco cansativos e, por isso começam a desmotivar as respostas (será, talvez, esse um dos seus objectivos). Não é possível argumentar com quem traz as respostas feitas e camufla com o nome de questões o que são afirmações.
Para além disso, este não é um blog destinado a discutir questões de âmbito nacional ou estritamente de luta partidária. Não cabe aqui ilustrá-lo sobre as origens revolução/golpe de estado/whatever de 25 de Abril de 1974 ou da democratização portuguesa na segunda metade dos anos 70, os seus protagonistas, acções ou intenções.
Não faz parte deste blog explicar-lhe a minha cosmovisão nem endereçá-lo para textos meus em outros espaços, como faz com os seus no Diário Digital. Não sendo este blog um projecto pessoal, mas a emanação de um conjunto de vontades que se confederaram para o construir num espírito de constestação às práticas locais, não me compete dirigi-lo para o meu blog pessoal.
Talvez o faça, apenas se achar que esta discussão se começa a personalizar em excesso e que começa a obstruir os objectivos originais do blog e os meus colegas (o Roldão Preto já não quer ouvir falar em si e começam a chegar alguns mails a protestar com esta monopolização do discurso).
Por isso, ficarei por algumas notas avulsas de carácter mais letrado, para o descansar quanto ao volume e profundidade das minhas leituras nas áreas que mais o interessam.
Quanto a definições políticas, a seguir Norberto Bobbio que distingue a esquerda e a direita tendo como base a crença na (necessária) igualdade entre os homens (a esquerda professá-la-ia e agiria para a implementar, enquanto a direita estaria conformada com a desigualdade existente, tendo-a como natural), se calhar sou mesmo de direita. Aliás, cada vez que leio algo sobre as questões da igualdade – John Kekes publicou recentemente um óptimo livro sobre o assunto com o título “The Illusions of Egalitarianism” (Cornell University Press, 2003), bem como o volume editado por Tibor Machan sobre “Liberty and Equality” em 2002 na Hoover Institution Press é excelente para analisar as fronteiras entre liberdade e igualdade e o que são os erros do igualitarismo (e está disponível na net) – fico com a sensação que sou um reaccionário empedernido. No entanto, quando leio coisas como as da nossa direita actual, sinto-me logo esquerdista. Então as do actual CDS, nem se fala. A começar pelo Pires de Lima Jr., distinto porta-voz da agremiação.
Li pouco Marx, porventura. Mas acho-o um bom autor e as suas teses são extremamente interessantes para compreender o mundo até à II Guerra Mundial. A partir daí explicam muito pouco e, entre apaniguados e adversários, era melhor que se conformassem a encará-lo como um autor decisivo no seu contexto histórico. As apropriações posteriores pelo leninismo e outros “ismos” do que escreveu Marx e as suas pretensas aplicações práticas são outra coisa com a qual não me preocupo muito. O seu tempo passou.
Mas, para quem gosta do tema e seus desenvolvimentos, podem sempre ler-se obras de referência: olhe, tem o acessível “100 anos de Socialismo” de Donald Sassoon no Círculo de Leitores ou, para os afrancesados, de Michel Dreyfus “L’Europe des Socialistes” (Editions Complexe, 1991) e de Jean-François Revel o fortíssimo texto crítico do comunismo “La Grande Parade – Essai sur la survie de l’utopie socialiste” (Plon, 2000).
O meu relativo desinteresse por Marx terá muito a ver com a precoce leitura de Max Weber, autor bem mais universal nas suas análises: “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo” só faz bem e depois tente achar uma edição de escritos de Weber (em Portugal é pouco e mal publicado) como os dois volumes de “Économie et Société” da Plon.
Já agora, para dar consistência à critica do marxismo enquanto filosofia da História leia “The Poverty of Historicism” de Karl Popper e, já agora, o que puder apanhar dele (“A Sociedade Aberta e os seus Inimigos” entre outros com tradução portuguesa), mas evite os pedantismos do João Carlos Espada, o apóstolo popperiano para estas terras.
A seguir, ou antes, leia (se ainda não leu) Raymond Aron em especial “Démocratie et totalitarisme” (na colecção Folio da Gallimard há uma edição recente, muito acessível para bolsos como o meu) e siga com “L’Oppium des Intellectuels” ou mesmo com “As Etapas do Pensamento Sociológico” (é grande mas há em português, o que sempre acelera a leitura).
Se quiser começar a fazer as comparações entre regimes totalitários. A Gradiva publicou um simpático livrinho em 1999 de François Furet e Ernst Nolte sobre “Fascismo e Comunismo”. Depois sobre as derivas autoritárias europeias, existe tanta coisa que nem sei o que lhe diga. Fiquemo-nos por alguns autores clássicos de centro-direita (não os mostre a historiadores ou políticos de esquerda que se torcem logo todos): de novo Ernst Nolte e “Les mouvements fascistes – L’Europe de 1919 à 1945” (é de 1969 nas foi reeditado pela Pluriel em 91 com a queda do Muro) ou Pierre Milza e “Les Fascismes” (1985 e, de novo, 1991).
Se gostar de aprofundar a análise entre as várias famílias históricas da direita que tal o volume “Fascists and Conservatives – The radical right and the establishment in 20th century Europe” editado por Martin Blinkhorn ? Penso que se lhe propuser o livro “Fascism, Past, Present and Future” de Walter Laqueur (Oxford Univ. Press, 1996) poderá sentir-se ofendido, mas não é essa a ideia.
Depois, para compreender melhor o que considero ser um debate de ideias e quais as causas do seu desaparecimento quase completo, nada como revisitar o muito conservador “The House of Intellect” de Jacques Barzun (1959, mas reeditado em 2002 nos Perenial Classics). Autor académico mais conservador, mas delicioso, é quase impossível.
Para perceber o prazer da leitura e apreciar o estilo de um escritor, mesmo quando não gosta dele, tem disponível “A Experiência de Ler” de C. S. Lewis (outro bem conservador) na lusa Âmbar.
E para melhor perceber os efeitos perniciosos da estupidez humana, é inultrapassável o artigo sobre as leis fundamentais da estupidez humana no voluminho “Allegro ma non troppo” de Carlo Cipolla (de caminho apanhe o “Comment voyager avec un saumon” de Umberto Eco, embora este já fuja um bocado para a esquerda)..
Para acabar com o caso português, depois da tareia que deu em Freitas do Amaral fiquei limitado nas propostas. Grande parte do que li deve ser para si propaganda do PC e amigos.
Com receio, atiro para o ar um livro sobre “A Teoria da Democracia e as Realidades da Europa do Sul” de Nancy Bermeo (Difel, 2000) para enquadramento.
Sei lá. O quê mais ? Um Manuel Braga da Cruz ser-lhe-á agradável ? “O Partido e o Estado no Salazarismo” ajudará a compreender os antecedentes do 25 de Abril ?
Ou só aceita mesmo Jaime Nogueira Pinto, detestável como é ao vivo, mesmo se intelectualmente acutilante ? “A Direita e as Direitas” (Difel, 1996) é bem razoável.
Como o homem andou pelas águas da AD, ouso sugerir o “Ensaio Histórico sobre a Revolução do 25 de Abril – O período Pré-Constitucional” do Medeiros Ferreira (o meu volume até está autografado, veja lá), mas renego tudo o que é livro da malta do Bloco de Esquerda e afiliados. Antes fascistas que sociais-fascistas, digam lá o que disserem, sempre é menos uma palavra.
Sobre os excessos de direita, “A Invasão Spinolista” de Eduardo Dâmaso ganhou um prémio de reportagem do Círculo de Leitores, mas acho que o tipo é lá pr’ás esquerdas.
E, pois é, reflexões de direita sobre o 25/A são um bocado escassas, para além de alguns testemunhos pessoais. Teorizações não são muitas. Vá-se lá saber porquê.
Não sei, mas acho que o Costa Pinto (grande promotor do “Abril é Evolução”) tem andado a bandear-se para a direita e até escreve benzinho, mas não chega a estas datas.
Mesmo para acabar, porque isto como que está a ficar pretensioso de mais, mas foi TM que pediu as referências, um último comentário sobre VPV. Quem escreveu o que escreveu foi TM, eu apenas disse que o homem bebia água. O passo em falso não foi meu. Cada um sabe do que sabe.
Mas, confesso, desde o volume “Tentar perceber” do início dos anos 80 e das crónicas até meados dessa década que não vejo que o homem esteja muito focado. Primeiro no Independente, depois na saudosa K e por fim no DN o indivíduo tem vindo a resvalar para o desvario e mera impercação contra quase tudo e todos. Com o António Barreto, que também acha que merecia um destino maior do que o que teve, fazem um belo par de velhotes dos Marretas, só que com menos graça e mais ressabiamento. Sempre achei que antifascistas tardo-juvenis dos anos 60 que acabam em Oxford a doutorar-se não combinam bem com o meu modo de vida (referência implícita à crónica autobiográfica que VPV deixou para a posteridade a páginas 135-138 da K nº 4 de Janeiro de 91).
E, mesmo para acabar, não critique o Freitas por ter colaborado com o Marcello (ou por apagar essa memória), pois até VPV escreveu que “vinte anos depois os valores de Marcello não se distinguem da actual ortodoxia política do poder” (VPV, “Marcello, as desventuras da razão” in K, nº 2, p. 162). Ele escrevia então a meio do consulado do Cavaco mas, verdade seja dita, se calhar agora escreveria o mesmo.
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