quarta-feira, novembro 03, 2004

The lost tapes - A primeira fita

Como prometemos já há quase um mês obtivemos por via de mão amiga, as cassetes áudio com a gravação da 1ª reunião do CACETE, Comité Abrangente para o Combate Eleitoral contra o Totalitarismo de Esquerda, esboço de organização destinada a conquistar o poder moiteiro ao PC através de uma coligação muito abrangente de todas as forças políticas activas no concelho.
Entre as vozes identificáveis, pensamos encontrar Afrodite Nogueira (pelo PS), o Dr. Sottomaior Maravilhas (pelo CDS/PP), o engenheiro Mimoso Desconhecido (pelo PSD), o Zé-da-Erva (pelo BE), o Zé-Tóino (militante de base socialista), a Catarina Sempre-Revolucionária (activista bloquista, ex-UDP), o José Amendoim (intelectual socialista local), a Maria Sete Dias (militante de base socialista), o Tiago Afonso das Dores (bem-pensante não-alinhado), a Cátia Tatiana (JSD a ver como pode subir na vida), o Ti Zeferino (reformado, sem mais nada que fazer), o Manel da Praça (bêbado, enganado no caminho para casa, mas que ficou agradado com o ambiente de tasca que encontrou). Ao sempiterno Leonel Coelho (MRPP) foi proibida a entrada com o argumento que ele ainda é comunista (se calhar o único de todo o concelho).
Este é, como sublinhámos, um exclusivo recolhido pelo nosso repórter Zé Berbigão, disfarçado como Joaquim das Couves, municípe eleitor em busca de esclarecimentos.
Passemos então à transcrição, cujo atraso se deveu ao facto do nosso colaborador ser de origens humildes e o blog não lhe ter facultado equipamento digital para a recolha da reportagem, pelo que foi demorado passar o conteúdo da fita magnética para papel.

(Ruído de pés a arrastar e de cadeiras a rangerem, alguns “pchius” e “tejam calados”).

Afrodite Nogueira (AN) – Damos então início a esta reunião...
Sottomaior Maravilhas (SM) – Ó Sôtora, quem é que lhe deu autorização para assumir a presidência da reunião? Isto aqui não é o PS, isto aqui é uma Democracia. Aqui há Liberdade.
Mimoso Desconhecido (MD) – Apoiado. Aqui deve haver isso tudo.
Zé-da-Erva (ZE) – O que é que se passa ? Não se pode fumar aqui ?
AN – Na qualidade de membro recém designado do Convénio Nacional do meu partido e atendendo ao peso eleitoral do PS a nível local penso que, a bem da unidade do CACETE, devo ser eu a presidir à reunião, não acham ?
José Amendoim (JÁ) – Apoiado, apoiado, só assim poderá acabar o desgoverno em que nos encontramos.
Tiago Afonso das Dores (TADinho) – Por um lado acho que sim, que seria uma nova dinâmica que se criaria mas, por outro lado, sinto que o desânimo me invade perante tudo isto.
SM – Ó Sôtores, por amor de Deus, haja respeito. Deve exercer o comando desta reunião quem tem provas dadas na defesa dos valores da Autoridade e da Ordem, ou seja, eu mesmo, eu próprio.
TAD - Assim não pode ser. Está-se aqui a criar uma dicotomia que não leva a lado nenhum.
ZE – Fuma-se ou não ?
Catarina Sempre-Revolucionária (CSP) – Fuma-se ! Ninguém está ver. Enrola lá essa treta.
Zé-Tóino (ZT) – Lá na minha rua há um buraco munta grande. A culpa é dos comunistas. Temos que correr com os gajos.
AN – Caro munícipe, concordo com a sua conclusão, mas temos que analisar a coisa em perspectiva. Por isso é que as minhas propostas para o concelho...
SM – Ó Sôtora. Lá está outra vez a tentar assumir o comando da reunião. Não pode ser.
MD – Apoiado, apoiado. O Doutor tirou-me as palavras da boca.
Maria Sete Dias – (MSD) – Despachem lá isto que está quase a começar a Quinta das Celebridades.
JA – Que cheiro a fumo é este ?
ZE – Porra que o gajo já deu com a coisa.
CSP – Agacha-te atrás deste mais gordo que ele não vê...
TAD – Amigos, amigos, assim não se consegue nada. Vamos a ter ordem.
SM – Ora querem lá ver este. Mas quem és tu, afinal, para estares aqui com opiniões ?
ZT – O raio do buraco é mesmo enorme, no meio da rua, no outro dia quando ia a passear o Rex quase que ia caindo lá para dentro. O raio do cão só conseguiu fazer o serviço ao pé da porta do 42 de tão assustado que ficou.
Manel da Praça (MP) – Ihhh, ca granda confusão. Acho que me enganei na tasca.
JA – Deixem a camarada Afrodite falar, ela tem a legitimidade de falar em nome da maioria do eleitorado descontente do nosso concelho.
SM – Ora querem lá ver mais este ? O que é que o amigo quer também ?
MD – Apoiado, apoiado. Este rapaz vai longe. Faz-me lembrar a mim quando era novo.

(Som de batidas insistentes na porta)
Leonel Coelho (LC) – Deixem-me entrar seus fascistas, que eu sou a voz do povo neste concelho desde que vocês ainda lambiam o ranho do nariz.

SM – Deixem esse comuna facínora lá fora !
MD – Apoiado, apoiado.
AN – Não sei se em nome dos princípios democráticos e da liberdade de opinião não deveríamos deixar o sr. Leonel entrar.
SM – Quais princípios democráticos ? Qual liberdade de opinião ? Isso não funciona com esses comunas sem vergonha.
ZE – Esta erva é boa ou não ? É cá uma pedra.
CSP – É da boa. Não me batia assim desde os tempos da Escola. Onde é que arranjaste essa merda ?
ZE – Ali no café onde a malta da GNR costuma ir beber umas bejecas à borla.
ZT – Já o meu Bruno Emanuel no outro dia também ia caindo no buraco quando ia a correr atrás da Vanessa Andreia quando iam para a Escola. Já vos disse aquele buraco é um perigo.
MSD – Despachem-se lá que o Conde Castelo Branco hoje ia mugir as vacas e eu gostava tanto de ver.
Ti Zeferino (TZ) – Deixe estar jovem, que isto é melhor c’aquilo.
TAD – Minha senhora, não tem vergonha de ver essas mediocridades na televisão ?
MDS – Ohhh, mediocridades ? O qu’é que você tem a ver com isso ?
TAD – Ó minha senhora, por favor...
Cátia Tatiana (CT, intervindo pela primeira vez) – Ah, eu gosto muito da Cinha; em tanto estilo, tem tanto savoá-férre. É uma pena que o nosso primeiro e ela já não se dêem bem.
MDS – Também acho, são tão jeitososo os dois. Faziam um casal tão jeitoso, com os filhos todos.
AN – Silêncio aí atrás !!!
SM – Então, sôtora, agora já manda calar o povo ?
JA – Esteja você calado, homem, que já me está a irritar.
MP – Hic ! Devo estar mesmo enganado na tasca. No Retiro dos Gajos não há tanto basqueiro nem quando o Fanã faz batota à sueca.
TZ – Você conhece o Fanã ? Sabe que ele ainda é primo do meu neto.
CT – O Fanã é bem simpático. Fala-me sempre. Gosto do crucifixo que ele usa sempre ao peito. Se não estivesse sempre a cuspir para o chão e deitasse menos perdigotos, nos tempos da Escola acho que ainda tínhamos namorado, que ele era bem engraçado.
JA – Quem é que está fumar aí atrás ? Eu estou bem a ver o fumo e cheira-me a qualquer coisa. É você aí de blusão de ganga ?
SM – Quem é que está a fumar droga nesta reunião. É preciso chamar já a polícia ?
ZE – Camaradas, tenham calma. O que falta nesta reunião é disciplina e organização, uma ordem de trabalhos e uma mesa de presidência previamente definidas, linhas orientadoras para a discussão. Podíamos fazer issso com base na importância eleitoral das forças políticas presentes no passado acto eleitoral para as autarquias. A partir daí ia-se dando a palavra aos representantes de cada partido e depois abria-se um espaço para debate com os outros municípes presentes. Também não seria má ideia criar grupos de trabalho para abordarem com profundidade cada uma das áreas temáticas de maior relevo (saneamento, obras públicas, rede viária, apoio aos jovens, etc), com um prazo para apresentarem um relatório das carências detectadas e com propostas de acção para o futuro.

...................... (Silêncio geral, ouvindo-se apenas uns protestos abafados de LC, ainda à porta)

CSP – Eh, pá. G’anda moca que tu apanhaste. Já não dizes coisa com coisa.
ZT – E o meu buraco ? O qu’e que se faz ?
MP – Tá decidido. Vou-me embora. Só vejo garrafas de água no balcão.


(Fim da fita da primeira cassete)
(Continua ...........)

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