sábado, julho 10, 2004

António da Costa sobre a política local

Melhorar como ?

Alguns artigos da imprensa local em clima pós-eleitoral e textos inseridos neste blog nos últimos tempos, principalmente o do José Silva mas também os remoques entre Titta Maurício e o nosso editor-em-chefe, acabaram por me convencer das dificuldades existentes em melhorar a vida política a nível local, atendendo à crise de qualidade dos seus intervenientes e à ausência de vias alternativas para um desenvolvimento do concelho que fuja às práticas herdadas do passado e que imperam na generalidade dos nossos municípios.
No concelho da Moita, 30 anos de governação do PC deixam uma herança que está longe de ser gloriosa e que, em comparação com outras autarquias comunistas da margem sul, fica muito aquém do que seria possível realizar. O adormecimento foi patente durante mais de 20 anos e, um pouco como no Barreiro, razões demográficas – envelhecimento do núcleo duro do PC e incapacidade de mobilizar os jovens eleitores, em fuga para os partidos da moda como o Bloco de Esquerda e do regime a nível nacional como o PS e o PSD – vão levar a breve prazo ao final do domínio do PC no município da Moita. A incapacidade de renovação não conseguiu ser contrariada e mesmo os esforços dos últimos anos para dar uma nova face ao concelho chegaram tarde, de forma desarticulada e quando os eleitores já dificilmente se encontrar em situação de ser convencidos por sprints de última hora, quando o rabo está a arder.
Com base nas tendências verificadas, a mudança irá favorecer o PS que irá, sem muito mérito, herdar a criança mas numa situação algo ambígua, pois não se antevê uma maioria absoluta nas próximas autárquicas. Perante o cenário de uma maioria relativa socialista, e partindo do princípio que não se deseja uma aliança aos antigos senhores do poder, o PS vê-se na necessidade de, para assegurar alguma governabilidade, estabelecer alianças formais ou informais. À esquerda restam os bloquistas e à direita o PSD, pois não é crível uma aliança com o CDS, atendendo à sua fraca base eleitoral e à agressividade da sua liderança local para com a esquerda.
Ora, uma autarquia moiteira PS/BE iria ser um espectáculo lindo de se ver. Gostaria de ver como gente tão bem pensante e politicamente correcta iria conseguir sobreviver perante os interesses instalados no concelho e aqueles que estão em fila para se instalar (melhor). Que posição assumiriam os bloquistas perante o conhecido pragmatismo dos socialistas a nível local ?
Quando a uma aliança do tipo Bloco Central seria também coisa interessante de observar, em particular no plano das obras públicas e do urbanismo, pois há quem queira rapidamente uma fatia (maior) de um bolo que está à espera de dominar de forma mais directa que a actual.
Ms o pior nem é a questão das forças partidárias que eventualmente venham a governar o concelho, o pior é a questão das pessoas, em concreto, que se perfilam como alternativa, o seu perfil, a sua competência, os seus desígnios.
Pois, porque pelos documentos produzidos pelas estruturas partidárias locais são de uma pobreza confrangedora e oscilam entre a crítica ao existente sem proposta de alternativas convincentes, os textos vagos e enrolados sobre questões estratégicas que ultrapassam o plano concelhio e os declarados manifestos de ambições maiores dos que os da conquista do poder a nível concelhio.
Se existe algum Plano Estratégico para o desenvolvimento integrado do concelho da Moita alternativo ao do actual executivo que seja para cumprir verdadeiramente (e que contemple o que se prevê para cada freguesia, para cada sector de actividade, com que calendarização, com que meios disponíveis) gostaria de o conhecer, pois porque manifestos eleitorais que se rasgam no dia a seguir às eleições e à tomada do poder, alegando que se não conhecia a verdadeira realidade da situação, já é prática demasiado corrente e desculpa que de tão esfarrapada, já não consegue encobrir nada.
Entre muitos, muitos outros aspectos, e para Alhos Vedros, conviria saber:
- Para quando a recuperação da zona ribeirinha, pois parece que no concelho é a única freguesia em que as margens do rio passaram directamente de sapal a lixeira.
- Está Alhos Vedros destinada a ser mais um dormitório sem identidade à semelhança do que se passa em outras zonas da margem sul ?
- O património edificado de valor histórico está inventariado e existe algum plano para preservar o que resta do núcleo histórico ? Lá porque a Moita não o tem, ou o pouco que tem despreza, não significa que em Alhos Vedros se faça o mesmo.
- A oferta pública de espaços para a prática desportiva esgota-se na piscina ? Não há qualquer interesse em fomentar a prática de desportos colectivos fora da SFRUA e do Vinhense ?
- A malha urbana da vila é para continuar segundo uma pseudo-lógica que segue os interesses privados disfarçados de uma eventual herança árabe (é que, caso contrário, o desenho das ruas, mesmo nas zonas de mais recente urbanização, parece saído da pena de alguém fortemente ébrio ou com descolamento da retina) ?
- Existe alguma ideia para desenvolver de forma mais que pontual a freguesia do ponto de vista económico ou vai-se continuar a alternar períodos de profunda crise com picos de actividade nascida de subsídios colhidos apenas por alguns ?
- È suposto que aquele espaço tido como destinado a actividades culturais, atarracado, mal amanhado e mal-aproveitado, seja o único investimento público em recintos para fins culturais ?
Se não conhecem a realidade, ou se dedicam a descobri-la ou então dediquem-se a outra coisa e não nos aborreçam.
Se a conhecem, deixem-nos saber como irão agir. Expliquem o que querem mudar, o que acham que pode permanecer e aquilo que são as vossas apostas, no concreto.
Ou então digam apenas que é tempo para rodar as clientelas que vivem do poder autárquico actual, porque já é tempo de serem outros a mamar.
Pelo menos, isso seria um argumento realista, sincero e corajoso.
Quanto ao resto, às palavras, já todos nós temos a nossa conta.

António da Costa, aos 10 de Julho de 2004

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