Resposta mais substancial às questões levantadas por Titta Maurício será dada quando o tempo o permitir, porque estes não são problemas menores, dos quais se fale com ligeireza, à la Bloco de Esquerda e amigos(as).
Quanto ao resto, só um ou dois reparos: realmente não é de si que falo quando escrevo sobre quem não pratica os valores apregoados da família conservadora. Não o conheço pessoalmente e, por maioria de razão, ignoro tudo sobre a sua família. Só conheço o que escreve. Falo, realmente, do líder do seu partido que enche a boca com muito e pratica pouco. Não o critico pelo celibato. Pode ser voto. No entanto, as minhas alusões não são motivadas pelas bocas do vox populi, mas sim pelo conhecimento que tive de muita gente dos primeiros tempos do Indie. Claro que este não é o tempo nem o lugar para atoardas desnecessárias. Fiquemo-nos por aqui, em nome do bom tom e da decência.
Em relação aos ideais que o levaram a entrar na vida política, em tese todos podemos dizer o mesmo. É sempre a Liberdade, a possibilidade de melhorarmos a vida de todos, o serviço à res publica (do Paulo ao Miguel Portas, para ficarmos na mesma família, todos recitarão a mesma ladaínha e nós não podemos saber quem é sincero). O problema é aquilo com que pactuamos, a caminho do que pretendemos. O problema são as parcelas de nós que ficam pelo caminho.
No meu caso pessoal, em tenra idade, percebi aquilo que teria de abdicar se entrasse no jogo político. Pesei os dois pratos da balança e ela pendeu desmesuradamente para o lado contrário ao do que promete prebendas e mercês em troca de um pouco da nossa alma. Se leu o Fausto de Goethe perceberá do que falo. Por isso, tive o cuidadoso escrúpulo de nunca usar símbolos partidários ou procurar esse tipo de guarda-chuva cómodo e protector, mesmo para efeitos profissionais. O mesmo se diga quanto à Maçonaria, à Opus Dei, à Opus Gay, à Trilateral do nosso Alberto João ou ao raio que me parta. O que não impede de ter amigos (e alguns familiares) maçons, supranumerários, homossexuais, penso que uma ou outra lésbica, adeptos da Terceira Via, comunistas, fanáticos pelo Bush, pessoal do Bloco de Esquerda, uma ou outra amiga que gosta de soutien preto sob camisa branca e amigos que usam fato de treino de lycra para irem ao supermercado ao fim de semana.
Dir-me-á que há formas de, cedendo aqui e ali, atingir uma situação em que se pode fazer o bem e ajudar a extirpar o mal (exemplo mais notório que o de Gorbatchov é difícil, mesmo se a herança é muito problemática), ou mesmo que poderemos passar impolutos pelo lamaçal, pairando sobre os aspectos mesquinhos da nossa vida política. Desculpe, mas não creio ser possível passar por certos caminhos sem, pelo menos, ver o que vai pela sarjeta e, nem que seja por omissão, colaborar com a vileza (o vocabulário está assim para o oitocentista, mas é o que sai).
Lá dizia um poeta que “por aí, não vou”. Só a título de exemplo, nunca poderia aceitar que a drª Celeste Cardona fosse nomeada para a administração da CGD. Acho que devia existir um mínimo de decoro na ocupação deste tipo de cargos, Digo-o não por demagogia mas por puro arrepio de desconforto pela baixeza com que se usa o Estado para recompensar fidelidades.
Por fim, a questão semântica. Não gosto do termo aborto, por questões estéticas e não morais. Soa-me mal, acho que não fica bem em lado nenhum, a menos que seja em contextos ofensivos. Mas isso não vem ao caso.
Escreve-se no Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa (de longe, o melhor no mercado) que “aborto” é “acção ou efeito de abortar”, “interrupção prematura de um processo mórbido ou natural”, “que nasceu antes do tempo”, “que é ou foi malsucedido; frustrado, malogrado”; “que faz malograr, falhar”, “que visa interromper instantaneamente o ciclo de uma doença”, “que é anormal, monstruoso, horrendo”. Já há cerca de um século, no Dicionário da Língua Portuguesa, Etimológicxo, Prosódico e Ortográfico das Livrarias Aillaud e Bertrand (pg. 7), descrevia-se “abôrto” como “parto prematuro, móvito, “atrofia nas plantas”, “coisa monstruosa ou disforme”, “pessoa de dotes extraordinários, quer no bem, quer no mal” (!!!), “malôgro”.
Como calculará, nenhum destes significados corresponde bem àquilo de que estamos a falar, pois, mesmo no sentido popular mais lato, “aborto” pode significar muita coisa e do que estamos a falar é dum contexto específico. Por isso mesmo, me recuso a, por comodidade, escrever “aborto” para cá e para lá, pois sei que isso apenas interessa para efeitos de choque. “Interrupção voluntária da gravidez” soará mais asséptica mas, porventura, descreverá melhor do que estamos a falar.
Mas sobre isso escreverei em ocasião futura.
Nota final: Imputei-lhe o uso de fatos azul-celeste, é certo. É ofensa de monta. Mas, de qualquer modo, quem cresceu nos anos 80 certamente que, no passado, usou coisa parecida ou mesmo pior. Eu usei e tenho fotos para o provar.
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