sexta-feira, março 09, 2007

Lacraus e outros bichos afins...

Se o lacrau se coçasse com a ponta do rabo, a espécie acabava

A hipocrisia e a falta de ética de alguns reis e senhores, e dos fiéis nas cortes ao seu redor, são tanta e tão venenosas que, se as bebessem por uma taça, caíam fulminados por terra com dose tão letal.
Vem esta reflexão a propósito da notícia no Portal da Câmara da Moita sob o título Câmara Municipal solicita inspecção à IGAT.

Nessa notícia pode ler-se em síntese o seguinte, devendo à cautela subentender-se em certas passagens exactamente o seu contrário:

“Têm surgido notícias nos órgãos de comunicação social sobre alegadas irregularidades, que não se coadunam com a realidade e visam denegrir o bom-nome da CM da Moita e do Executivo Camarário. Essas notícias suscitam um clima de suspeição perante o órgão autárquico - Câmara Municipal - e de todos quantos nela trabalham. Não existe fundamentação para tal. Por isso a Câmara decidiu por unanimidade solicitar uma inspecção à IGAT - Inspecção-Geral da Administração do Território, por forma a clarificar todo o processo.”

Ora, importa ter bem presentes pelo menos 5 alertas:

Primeiro, sobre …”alegadas”:

As irregularidades, antes de provadas em Tribunal e antes de a sentença transitar em julgado, são sempre alegadas, como é natural.
Acontece que a discussão política e a participação dos cidadãos na vida pública pode e deve apontar o que se considera justo ou injusto, correcto ou incorrecto, moral ou imoral, legal ou ilegal, bom para uns e mau para outros, sem que se deva estar sempre à espera de uma hipotética decisão judicial para que se possa participar na apreciação e na gestão da “res publica” em democracia.
Era o que mais faltava.
Por essa ordem de ideias, não haveria nem governos nem povo soberano, toda a apreciação política seria obrigatoriamente sobre factos alegados, logo menos nobre e menos credível, até menos tolerada. Ficaríamos dependentes sempre das decisões judiciais com trânsito em julgado, e o governo da cidade ficaria na mão de pessoas com cabeleiras postiças e togas até aos pés. E o povo todo à espera, sem se poder pronunciar.
Por isso, o conceito de “alegadas” não isenta, nem culpa. Os factos são o que são, e na Moita as coisas estão por demais claríssimas, aos olhos de quem as queira ver e entender.

Segundo, …”visam denegrir”:

Em Portugal, em 2007, todos devem fazer um esforço para banir do seu vocabulário as expressões e termos racistas e discriminatórios, a muitos níveis, que a linguagem vulgar subliminarmente introduziu ao longo dos anos na nossa língua.
Todos têm esse dever, e têm-no particularmente as entidades oficiais e o Estado, incluindo os órgãos de poder local, quando falam, e muito em especial quando escrevem de forma oficial.
Seja por isso dito com clareza à Câmara Municipal da Moita que errou e deve corrigir a referência inadvertidamente racista a que recorre ao usar o termo “denegrir” para significar que o que é negro, é lesivo do bom-nome, e desacredita quem quer ou o que quer que seja.
E já agora, esclareça-se que o contrário de “branquear” não deve ser em política “enegrecer”, mas sim “sujar” ou “manchar”.
Passemos apesar de tudo adiante, não terá sido intencional, há quem não saiba muito do que escreve. Um dia estas pessoas serão mais cuidadosas com o seu linguarejar, e os termos “judeu” para traidor, “velhaco” para ruim, “cigano” para vendilhão, “alentejano” para lento, “denegrir” para sujar, “efeminado” para mole ou medroso, “caduco” para mais velho, “peixeirada” para discussão, “saloio” ou “campónio” para menos adaptado ao maneirismo, “urbano” para educado, “direitos do homem” para direitos humanos, “mongolismo” para trissomia 21 e outros da mesma laia, serão de todo banidos da nossa linguagem, mais ainda dos comunicados oficiais dos órgãos de poder em democracia.

Terceiro,…“não se coadunam com a realidade”, e…” não existe fundamentação para tal”:

O Projecto de novo PDM da Moita e o Processo de Revisão que decorre desde 1996 apresentam numerosas situações e comportamentos fora-da-lei, com marosca económica mal escondida, traduzem-se em crime ecológico onde a perda ambiental é total, e não compensada minimamente, encerram situações várias de crime de lesa democracia, tresandam a situações de amanhanço privado e pessoal.
Não fosse a verificação de tudo isso e de muito mais, seria já um exagero insuportável a má governação politicamente corporizada pelo Partido (PCP) e pela Coligação (CDU) na Moita, onde os favores a meia dúzia são o verso, a face visível do governo do Município.
Por todas as razões, e também pelo facto de não ter sido o PCP criado fez agora 86 anos para defender os ricos e poderosos engordados à pala das mais valias urbanísticas sacadas com uma assinaturazita num papel, contra as pessoas sem riqueza e sem poder de lobby.Foi ao contrário, como se sabe.
Essa má governação, entretanto, tem o seu reverso.
E o reverso dessa política são as medidas de desenfreada betonização do Concelho, o abandono e a desertificação do miolo envelhecido das localidades, e o assédio tresloucado a mais e mais terras rurais virgens, depressa viradas Solo Urbano, onde as pudicas protecções de REN e RAN existentes são tiradas e deitadas fora mais depressa do que macaco macho joga fora uma casca de banana, quando guloso a quer comer.
Esta é a nossa realidade. Estes são os factos fundamentados.
A sua descrição espelha a realidade, assenta e funda-se nela. Ponto.

Quarto…”são uma suspeição perante o órgão autárquico - Câmara Municipal - e de todos quantos nela trabalham”
Velha táctica essa de fazer o mal e correr o faltoso a esconder-se no meio da multidão, não vá alguém reconhecê-lo e apanhá-los pelas orelhas isolado e às claras.
Ninguém nunca disse que a suspeição é virada contra ”todos os que trabalham” na Câmara da Moita.
Pretendê-lo é apostar na confusão e na baralhação política, para se esgueirarem melhor os verdadeiros responsáveis, encobertos no seio do colectivo.
Por conjunto e atacado, serão talvez meia dúzia de Empresas, mais meia dúzia ou mesmo menos de Dirigentes e Sacristães, rodeados de uma pequena corte de “Yesmen”, e ainda um leque indeterminado de controleiros políticos frouxos e sempre a fazer ó-ó, tanto locais, como regionais e nacionais, e pouco mais.
De resto, ninguém mais tem nada a ver com o assunto.
Pretenderem os visados chamar todo o mundo ao barulho é manobra que só ajuda a desmascará-los como ardilosos, numa manobra que em nada compromete quem nunca de “todos quantos nela trabalham” falou.

Quinto…” Por isso a Câmara decidiu por unanimidade solicitar uma inspecção à IGAT”

Ai tão boazinha, ai tão preocupada, ai tão clarividente.
A nossa bendita Câmara pensou, pensou, e decidiu “por unanimidade solicitar uma inspecção à IGAT, de forma a clarificar todo o processo.”
Foi uma mola que a fez pular, foi aquilo a que se costuma chamar auto ignição.
A Câmara neste caso pegou por estaca, não terá precisado de enxerto.
Para quem no geral pega de empurrão, foi um relance de autonomia notável.
Terá sido?
Nada se diz contudo sobre o facto de as inspecções há muito serem pedidas, e directamente ao próprio Presidente da Câmara.
Nem tão pouco sobre os Requerimentos Parlamentares nesse sentido.
Menos ainda sobre as Respostas Ministeriais já em carteira.
Nem sobre as anteriores iniciativas dos Vereadores da Oposição, rechaçadas liminarmente nas últimas Sessões de Câmara, que só pecaram por falta de formato claro e solene, fora o resto.
Nem uma palavra sobre a autoria da Proposta, o que seria para além de um exercício de verdade e de informação, uma prova de respeito pelos direitos de autor.
Nem tampouco sobre o pedido ao Governo que rejeite as Propostas centrais do Projecto de novo PDM, dos mesmos autores e no mesmo momento da dita iniciativa.
Nada disso.
Só antevisão e decisão ponderada da Câmara.
Molto bene.

Eis pois então uma verdadeira Notícia isenta e nada hipócrita!
Diante destes specimens, o Pandinus imperator e o Typhlochactas mitchelli antes parecem pouco mais que simpáticas joaninhas.
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Leitor

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