Hipocrisia - eu sei que é a regra na vida política, mas continuo sem me conseguir habituar à teoria de que uma mentira política é uma mentira diferente das outras e que o que se diz na refrega pública, faltando sem vergonha à verdade, não equivale, em matéria de desonestidade, a outro qualquer tipo de comportamentyo semelhante em outras áreas da vida. Nos últimos anos, neste particular, o poder moiteiro e os seus homens e rapazes de mão, especializaram-se numa espécie de hipocrisia retórica em que o valor das palavras e dos actos parecem prisioneiros de um relativismo demasiado pós-moderno. Vou dar três exemplos de duplo padrão entre o que se diz e o que se faz ou entre o que é bom para nós mas é mau nos outros. Em primeiro lugar, toda a forma como se ergue um discurso crítico contra o papão do Poder Central, contra o qual é legítimo usar todos os meios de luta, incluindo a agitação social e a produção de opinião violenta, mas depois se considera ilegítimo que esses meios sejam usados contra o poder local; ou seja, as eleições e as maiorias valem mais quando e onde se ganha e menos quando e onde se perde. Os "outros" são passíveis de escrutínio e crítica, mas "nós" não. Quando somos "nós" a criticar podemos usar todo o tipo de argumentos e ofensas, mas o contrário já não é válido. Segundo exemplo: quando os "outros" fazem algo longe do olhar público e se acomodam a situações de privilégio, são passíveis de crítica e reprovação pública, mas quando somos "nós" a preparar aposentações pré-eleitorais, longe do conhecimento dos eleitores, isso já é direito à privacidade e são questões pessoais. Os outros procuram "tachos", nós rapamos frigideiras. Os outros escondem o que devia ser público, nós reservamos o que são questões de índole privada. Terceiro exemplo: os "outros" fogem dos cargos para que foram eleitos e fazem-se substituir de uma forma que não respeita a vontade expressa do eleitorado, "nós" somos diferentes e os cargos pertencem ao partido, pelo que as pessoas podem ser substituídas a qualquer momento, mesmo contra a sua vontade expressa, porque tudo tem cobertura legal. E o que falar das ditaduras boas e das más? O mais extraordinário é que as mesmas pessoas defendem uma coisa e o seu contrário, em semanas alternadas, com o mesmo desplante e falta de vergonha pelas pessoas, que devem considerar acéfalas ou demasiado estúpidas para não perceberem as gritantes incoerências. Os outros fazem isaltinadas e felgueirices, pelo que devem ser afastados, os nossos fazem tudo bem e são os melhores, mas devem ser na mesma afastados. Desculpem-me a antiguidade dos princípios, mas a falta de vergonha e a maleabilidade retórica e o duplo padrão na apreciação dos actos políticos e pessoais deveriam ter limites e quem hoje defende a água e amanhã o fogo não devia esconder a fraqueza de carácter ou de verticalidade, por trás do "colectivo".
AV1
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