Sei que já somos acusados de metermos o nariz em todo o tipo de assuntos, mas por vezes, mesmo não sabendo muito sobre certas questões, convém chamar a atenção para elas.
Sei também que alguns leitores parecem pensar que queremos o regresso a um passado bucólico ou idílico que não terá sido tão agradável como agora parece.
No entanto, existe uma diferença entre querer manter o que era bom desse passado, integrando-o no inevitável progresso, e querer regressar à Idade da Pedra.
Vem isto a propósito da defesa que aqui já fizemos diversas vezes da necessidade de defender e preservar a natural cobertura vegetal desta zona, em grande parte já destruída ou substituída de forma errada. Quando defendemos a necessidade de manter zonas de bosque ou mata indígena (pinheiros, sobreiros, carvalhos, árvores de fruto, etc) não é só porque somos maluquinhos ecologistas.
Não, temos é a consciência de que essa é uma estratégia fulcral para reduzir o impacto negativo de conjunturas de seca como a que estamos a atravessar e não nos lembramos disso só em momentos de aflição.
Uma cobertura vegetal minimamente densa e compacta – diferente de se plantarem fileiras de árvores ou pequenos núcleos meio desirmanados em rotundas ou mini-jardins, ainda para mais com plantas que necessitam de regas intensivas – é essencial para, por um lado, travar a erosão dos solos e, por outro, para manter níveis de humidade na atmosfera indispensáveis para combater os efeitos da poluição atmosférica (e, por tabela, para combater a propagação de algumas doenças do aparelho respiratório), isto já não falando na preservação de ecossistemas equilibrados de fauna e flora.
Com efeito, não é desbastando sem critério zonas de pinhal, montado ou outro tipo de bosque, alegando que se está a fazer uma limpeza necessária ou que se estão a podar as árvores para crescerem melhor, que se defende a qualidade de vida. A cobertura vegetal permite evitar uma maior evaporação da humidade do solo e, ao mesmo tempo, diminui a erosão dos solos causada pelo impacto directo das chuvas e ventos. Isto é evidente, se atentarmos por exemplo no que se passa em zonas semi-desbastadas sem qualquer critério como junto à Makro de Vila Amélia, no lado sul da A2, em que todo o solo se encontra apenas arenoso, por já ter sido returada toda a camada de húmus superficial. No nosso concelho a gradual destruição das manchas verdes à volta de Alhos Vedros, na Barra Cheia, na zona do Pinhal das Formas, com este ou aquele pretexto conduziu à completa destruição dos ecosistemas naturais e ao empobrecimento do solo para qualquer utilização que não seja a construção civil.
É óbvio que é indispensável fazer melhores acessos e construir novas casas, mas isso não deve ser feito sempre à custa da cobertura vegetal, em especial de árvores de médio ou grande porte porque são essas que abrigam a vegetação arbustiva e o solo. Cortando as árvores maiores, que fazem sombra, tudo o que lhes ficava por baixo passa a receber directamente o calor do sol e a acção dos elementos naturais, acabando por sofrer dramaticamente com isso. E não é plantando uns caniços que demoram pelo menos duas décadas a crescer, e nem sempre sendo de espécies adequadas a este tipo de solos, que se compensam os danos feitos.
Na Margem Sul, devido á pressão urbanística e à fraqueza e falta de visão estratégica dos autarcas, o dormitório avançou à custa da floresta, com uma crescente impermeabilização dos solos, a destruição dos equilíbrios naturais e o aumento da vulnerabilidade aos efeitos de condições climatéricas anómalas. Depois, o argumento-padrão perante os desastres é que as condições não foram as normais para a época. Se chove muito é porque chove muito, se chove pouco é porque chove pouco.
Pois é, ninguém explica que essas “condições normais” são obtidas através de médias e que essas médias são feitas a partir exactamente das variações que depois consideramos anómalas. Uma média de 6, corresponde a um conjunto de valores que podem oscilar entre o 2 e o 10, não a uma sucessão de 6’s.
Para evitar os problemas, a acção deve ser feita de modo preventivo e não a posteriori como remédio.
Ora, se a desertificação avança rapidamente desde o sul de Portugal e se os efeitos desse fenómeno são, já a médio prazo, gravíssimas, porque será que as autarquias não fazem planos de ordenamento do seu território que combinem todas as necessidades das populações, as mais e as menos evidentes ? Porque será que os PDM’s – já de si, muitas vezes deficientes – só podem ser desrespeitados quando é para destruir a natureza e não para o inverso, para a preservar e para a expandir ? Porque será que uma reflorestação consequente das zonas em risco de erosão nunca é uma prioridade ? Porque não dá dinheiro aos cofres/orçamentos das Câmaras ? Porque não é obra “que se veja” e que se traduza em votos ?
Mas, afinal, para que servem os políticos locais ? Para conduzirem da melhor forma os destinos das populações que transitoriamente governam ou para se perpetuarem e às suas clientelas no poder ?
As árvores não votam e a preservação das manchas verdes naturais pode não ser um argumento eleitoral óbvio. No entanto, devia ser uma prioridade para todos aqueles que tenham uma noção que a nossa qualidade de vida não depende, a médio e longo prazo, apenas de mais betão e alcatrão. Mas, infelizmente, e pelo que se vê, por cá as prioridades continuam a ser ao nível terceiro-mundista em que mais casas é que é progresso, sejam feitas à custa do que forem.
Depois, não adianta andar a encher a boca com os chavões da defesa da floresta tropical, da Amazónia ou com coisas bem-pensantes do mesmo género, se não fazemos nada na nossa casa.
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