sexta-feira, dezembro 23, 2005

Que dizer ?




A leitura das primeiras páginas do relatório sobre a sondagem arqueológica feita no local da antiga cadeia contém explícita e implicitamente elementos que nos fazem duvidar da capacidade do nosso poder autárquico para dizer seja o que for sobre preservação do património.
Passando, por agora, adiante a discussão sobre o que ali se localizaria, fiquemo-nos apenas com alguns detalhes sobre as condições do trabalho realizado.
A páginas 2 lê-se:

«Como escrevemos, no memorando do pedido de autorização, a intervenção resumir-se-ia a pequenas sondagens para registar alguma eventual estratigrafia que ainda existisse após as demolições e terraplanagens.»

Ou seja, fez-se a sondagem depois da demolição, quando já estava tudo destruído e esburacado. Significa isso que nenhum cuidado houve da parte da CMM e da JFAV de acautelar um estudo prévio, pois isso poderia certamente perturbar os interesses do proprietário e os seus projectos, caso se encontrassem vestígios relevantes. Ou isso, ou então foi apenas pura ignorância relativamente aos procedimentos normais nestes casos.
Mas passemos mais à frente:

«Da parte do proprietário houve inteira disponibilidade para a realização da interveção arqueológica, com a condição de que esta se circunscrevesse ao tempo previsto (...) como dissemos anteriormente, as sondagens foram programadas para serem realizadas durante o mês de Dezembro de modo a não interferir com as obras programadas para o local, no mês seguinte.» (pp. 2-3)

Portanto, a intervenção foi possível porque o proprietário deixou, não porque a CMM o tenha exigido ou mesmo imposto como condição para o avanço das obras. A equipa trabalhou de acordo com o calendário do proprietário e só fez o que a deixaram fazer, desde que não atrapalhassem o empreendimento. Verifica-se a total ausência de um acompanhamento por parte de qualquer pessoal técnico da CMM, retido nos gabinetes ou a tomar cafézinho.
Mas temos mais:

«A cobertura logística e financeira da intervenção ficou a cargo dos signatários.»

Isto é indescritível e vergonhoso.
Por muitos erros e lacunas que tenha a intervenção, quem a fez fê-la "por gosto", porque o trabalho desenvolvido foi feito à própria custa.
Vergonhosa a inacção da JFAV e da CMM a este propósito.
Enquanto reservavam milhares de euros para aoutdoors sobre "obra feita" não disponiobilizaram quaisquer meios para esta intervenção.
Claro que só a deixaram seguir, porque o proprietário não se importou.
Claro que à CMM quanto menos se fizesse e se encontrasse melhor, porque assim se encobriria com maior facilidade o crime permitido e cometido.
Mas há sempre mais:

«Após a abertura das três sondagens verificou-se que o local tinha sido completamente arrasado e que dali não se poderia tirar muito mais informação pelo que se deu [por] concluída a intervenção após o registo de desenho de campo.»

É óbvio que sondar ou escavar depois da demolição era algo que só poderia acabar nisto.
Está escrito agora para consumo geral o que na altura se tinha visto e contra o qual se tinha protestado.
A autorização para a demolição e escavação do local foi dada pela CMM sem qualquer tipo de condições e salvaguardas e, durante todo este processo, a autarquia esteve sempre ausente, não delineando os trâmites da intervenção, não a apoiando financeira ou tecnicamente.
Isto é lamentável e, repito-o com a boca e o teclado cheios, vergonhoso.
Não me venham com história: a presidência da CMM e o sector do Urbanismo foram os responsáveis por uma situação terceiro-mundista, causada por mera ignorância, má-fé ou incompetência.
Ou tudo junto, que é o que me parece.

AV1

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