sexta-feira, janeiro 27, 2006

O Nalguinhas da Moita - II

As razões de forma de um prémio
O Antropólogo em Si

Comecemos então por detalhadamente explicar a nossa particular preferência por atribuir o prémio Nalguinhas da Moita, a V. P. Mendes, político local, aficionado dos bois, articulista emérito e antropólogo, conforme se gosta de apresentar.
Ora é mesmo aqui que eu começo por embirrar.
Será que, acaso, V. P. Mendes, considera mesmo que antropólogo de corpo inteiro, de pleno direito, é aquilo que melhor o identifica ?
A mim, parece-me antes reflexo de moitice profunda.
É que não chega uma licenciatura numa área para fazer um oficial desse ofício.
Se eu me formei em Arquitectura e acabo a dar aulas de Artes Visuais no Ensino Secundário, nunca tendo exercido o metier para além de uns biscates, quando opino sobre política ou educação, será adequado nomear-me como "Arquitecto".
Se for licenciado em História, mas trabalhar como técnico de uma Biblioteca, não passando a minha ligação à disciplina de mais do que a leitura ou participação num par de Colóquios, deverei apresentar-me ao público como "Historiador" ?
Ou se tiver cursado Filosofia, mas tiver como modo de vida o cargo de administrador de uma empresa ou dono de uma livraria, deverei nomear-me "Filósofo" quando dissertar sobre as actualidades do momento ?
É que o problema nem está tanto na designação ou mesmo na sua adequação ao que alguém se sente, mas mais na relevância para o efeito que é evocada.
Vejamos, como paralelismo, o caso do nosso leitor e muitas vezes crítico, Nuno Cavaco. O homem tem uma formação académica especializada bem específica, até ligada à sua ocupação profissional, mas quando escreve sobre política sempre teve o bom-senso de se identificar como "militante de..." ou "candidato a...".
O mesmo se passa, aliás, com a generalidade dos articulistas da nossa praça local e global.
Mas VPM, não !!!
Ele é antropólogo.
Ele traz consigo valor acrescentado !
Quando disserta sobre as maravilhas da campanha cavaquista, é por certo numa perspectiva antropológica, plena de conceitos sobre a liderança recolhidos em Evans-Pritchard, Malinowsky, Roger Caillois, Mircea Eliade, Lévi-Strauss, Mischa Titiev ou mesmo num portuguesíssimo Mesquitela Lima, num Pais de Brito, num Raul Iturra.
Nós podemos não perceber, mas está lá.
Quando no rescaldo eleitoral das autárquicas se chegou à frente para linchar a direcção local do seu partido - que por acaso o afastara das listas - fez isso de acordo com uma visão antropológica do comportamento humano em situações de conflito tribal e do papel da traição e hipocrisia no relacionamento humano em grupos fechados.
Nós podemos continuar a não perceber, mas está lá.

Pois...
Ou é isso ou é aquele tipo de pretensão balofa, moiteira, em que a vaidade tolda o entendimento de si.
Mas eu irei rever os meus conceitos, porque posso estar errado.
Lá porque há quase 20 anos que trabalho na minha área de formação académica, e em boa parte desse tempo isso constituiu a minha principal fonte de rendimento, mas não me atribuo o título de X e me limito a escrever fulano de tal, formado em..., trabalhando em..., não quer dizer que os outros não o façam.
Afinal, o homem lá porque é técnico da CMM não quer dizer que sinta um antropólogo dentro de si, clamando por liberdade e por aparecer nas fotos dos jantares e nas notícias das eleições das Associações e Conselhos Taurinos da terra.
O problema é que no meu dia, a distribuição de água-benta e auto-indulgência sofreu um racionamento.
No dia do nosso Nalguinhas era à discrição.

AV1 (muito preesumido nas suas convicções)

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