terça-feira, outubro 04, 2005

Momento Cultural

«Em certo lugar da Mancha, o nome amanhã o direi, vivia, não há grandes anos um fidalgo, destes velhos fidalgos de lança em armeiro, adega antiga, pileca à manjedoira e galgo corredor. Bons três quartos do rendimento gastava-os no comer: cozido, obrigado mais vezes a vaca do que a carneiro, com o infalível empadão dos sobejos à ceia, uma fritada de ovos com miúdos e toicinho aos sábados, lentilhas às sextas,e o seu borracho extra uns domingos por outros. O resto ia-se no vestir: saio de velarte e calças de veludilho com pantufos do mesmo pano nos dias santos; a cote, saragoça, embora da mais fina.»
(Parágrafo de abertura do D. Quixote de la Mancha, na tradução de Aquilino Ribeiro, reeditada pelo jornal Público com a edição de hoje)

Confesso que as minhas memórias da primeira leitura do D. Quixote são vagas.
Sei que o li, provavelmente da Biblioteca da Gulbenkian, mas era claramente mais areia do que a minha camioneta de 10-12 anos aguentava e só me lembro das patetices do Sancho Pança.
Aproveitando o centenário da obra, pensei relê-la, mas a malta cá é rica e só se planearam edições de luxo, porque à arraia-miúda a cultura deve fazer lombrigas. É tudo de 50 euros para cima, incluindo a que vai sair com o Expresso.
Não é bem assim que melhora a literacia da população, mas quem edita lá sabe com o que se cose.
Vá lá que o Público faz a coisa por metade, com cada um dos dois volumes a ficar-se pelo 12,5 euros, ganhando-se a tradução do Aquilino Ribeiro - que parece dançar no seu vocabulário deliciosamente anacrónico para os tempos de hoje - e as ilustrações de Gustavo Doré.

AV1

Apostilha necessária: Eu sei que é difícil, mas por uma vez, vejam lá se isto não serve para comentários sobre quem fez o quê onde, quem mentiu quando ou quem não fez o que prometeu. Só um bocadinho de boa vontade, em memória de Cervantes.

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