sábado, outubro 01, 2005

Nós e os "Outros"

Ontem, quando já devia estar a descansar o miolo, pus-me a ver a repetiçaõ da cerimónia dos Emmys no AXN. Era apresentada pela Ellen deGeneres, uma comediante americana que não aprecio em particular, tirando o facto de ter como namorada a Portia de Rossi (aquela louraça que entrava na série AllyMcBeal).
As piadas iam seguindo, ainda meio secas, quando ao ganhar ritmo acerca da relatividade dos prémios, a Ellen lá meteu umas mais cruéis que fizeram todos rir, porque eram gerais; de repente, diz qualquer coisa como isto "Ganhar um Emmy não é nada de importante na vossa vida; isso seria ganhar um Óscar".
Aí, os aplausos esmoreceram e notou-se um razoável embaraço.
A piada não era sobre os "outros" ou "alguém" em geral , para passar a ser direccionada a todos os que ali estavam e que, salvo raríssimas excepções, alguma vez cheiraram um Óscar (estava lá a Meryl Streeep pelo menos). Ou seja, era uma piada contra os "nossos" os da televisão, por oposição aos do cinema, os "outros".
Serve este introdutório todo para explicar algo simples.
As piadas têm graça quando são aplicadas aos "outros".
O humor é sempre giro quando não se aplica a nós e aos "nossos"; aí já é tudo de mau gosto e rasteiro.
É o que se passa aqui no AVP, quando gozamos em particular com alguém: tem graça para os não visados, mas é uma baboseira para quem é criticado.
Nós só somos certeiros quando acertamos nos "outros".
Quando acertamos nos "nossos" (deles), já somos umas bestas.
A auto-crítica é uma coisa de difícil e dura experiência.
Quando andámos a considerar o que fazer com os disparates que se foram sucedendo nos comentários, sempre o pensámos em função da mera má-língua dirigida a terceiros. No nosso caso, e como dizia o AV2, "aquilo até me inspira". E no meu caso também, embora mais nuns dias do que em outros. Se não olharmos para nós de forma crítica e percebermos que nem sempre agimos bem - e é batota dizer isso em abstracto, convém assumir exactamente quando fizemos coisas menos boas ou mesmo más - temos tendência para ficar autistas e não conseguirmos captar o que se passa "lá fora".
Esse é um erro que se está a passar com algumas pessoas dos dois lados maiores desta barricada eleitoral. Em tempo de "guerra", cerram-se fileiras e opta-se pela estratégia romana (via Astérix) da tartaruga.
Deixa-se de tentar perceber os "outros" e só se aplaudem os "nossos".
Tudo o mais é considerado "traição".
O mundo fica a preto e branco, sem cinzentos.
E depois aplaudem-se asneiras e recusam-se coisas sérias e válidas, só porque dividimos o mundo entre nós (os bons) e os outros (os maus).

AV1

Sem comentários: