sexta-feira, janeiro 27, 2006

Anonimato e Crítica

João Pereira Coutinho é um menino de família pseudo-bem e também um pseudo enfant terrible da nossa direita política.
Apesar de um pai homónimo que, para além do dinheiro, tem muito pouco a dizer e só diz platitudes quando é entrevistado, JPC jr. é um tipo inteligente e escreve muito bem quando não se quer dar ares de seriedade.
Nas "crónicas" que faz no Expresso é uma autêntica desgraça, mas nos apontamentos que publica mensalmente na Maxmen, a concisão da fórmula eleva-o a outros voos de perspicácia.
Vejamos o que este mês (nº 59, p. 40) escreve sobre o anonimato, e que vou transcrever morosamente porque a distribuição do texto ficou muito dispersa na página e não dá para escanear:

«Serão animado na companhia de "críticos" amigos. Subitamente, alguém atira para cima da conversa o último romance da escritora X. No espaço de breves segundos, a escritora X é reduzida a pó e os críticos, saciados com o repasto, declaram ainda sentenças de morte para os excritores Y e Z. Fico assombrado com a violência das sentenças - eu, assombrado, com a violência das sentenças, e tudo na mesma frase. Dias depois, ao folhear os jornais do dia, deparo com o inevitável: um dos comensais da noite elogia, sem reservas, a escritora X do jantar anterior. E, também sem vergonha nem memória, estabelece paralelismos simpáticos com Y e Z. Os nossos "!críticos" não dizem o que pensam e, pior, não pensam no que dizem. Como terminar este ciclo infame de cobardia intelectual ? Eu, honestamente, só vejo um caminho: o jornalismo português, a começar pelo cultural, devia abraçar o anonimato. Não que a medida seja ideal. Longe disso, Mas, ironia maior, é incomparavelmente mais saudável do que o caldo de hipocrisia onde a nossa "crítica" chafurda sem pudor. Além disso, convém lembrar que o antigo TLS [suplemento literário do jornal Times] praticava o género. A actual The Economist pratica ainda. E, num País sem confronto nem debate, talvez o anonimato fosse condição primeira para um jornalismo crítico digno desse nome.»

Concordo.
Pois, por cá todos se conhecem a todos, todos são primos de todos, todos tomam a bica nos mesmos cafés e jantam nos mesmos sítios. Aqueles de quem JPC falam atém partilham as mesmas camas.
Depois, é chato, muito chato dizer mal, porque lá se vão os convites para os lançamentos, para as inaugurações, para umas cambalhotas no leito.

É por isto (e mais alguma coisa), que sempre evitei grandes familiaridades com as pessoas que critico (ou posso vir a criticar) aqui no blog ou então o pessoal sabe ao que vai (ou é bom que saiba). Por vezes, pedem-me o contacto deste ou daquele. Não tenho, mesmo se conheço.
E porque não socializo muito em ambientes conspiracionistas ou pseudo-críticos ?
Porque à mesa do jantar ou por escrito, por regra, digo/escrevo o mesmo.
E há quem não goste.
Há quem pense que, por nos conhecermos desde pequeninos, devemos tolerar as sacanices uns dos outros.
Ou só porque nos conhecemos.
Não concordo.
Não, assim ao longe é melhor.

AV1

1 comentário:

Ponto Verde disse...

Privilégios... sobre outro tipo de privilégios veja como construir uma urbanização familiar em pleno Parque Natural da Arrábida.