VII - Como utilizar um carro - As prioridades
Eu sei que aqui na zona, em especial quem tirou cartas de condução numa certa escola da Baixa da Banheira, não era preciso saber conduzir para passar no exame, bastando conseguir meter umas notas dentro de um envelope e, depois de lamber a cola e o fechar, entregá-lo ao instrutor ou deixá-lo no tablier para o examinador.
Mas isso não implica que, com o tempo, uma pessoa não se esforce e não tente descobrir como são as regras de condução, das quais uma das mais importantes é a das prioridades em cruzamentos e afins. A regra é simples, na ausência de sinalização em contrário, dá-se prioridade a quem surge pela direita.
Esta regra, porém, depara com dois problemas: o primeiro é o de muita gente que conduz não saber distinguir a sua mão direita da mão esquerda; o segundo é o de outra tanta gente, ou mais, que conduz ser rudemente mal educada, não possuir um mínimo de civismo e, para cúmulo, achar que a sua forma de condução é o melhor método de se afirmar numa sociedade na qual, segundo qualquer outro parâmetro, não consegue qualquer lugar de destaque.
Por tudo isto, que não é pouco, a regra de grande parte dos condutores é, “DESDE QUE CHEGUE UM MILÉSIMO PRIMEIRO, OU ESTEJA UM MILÍMETRO À FRENTE A PRIORIDADE É MINHA”, atravessando-se à frente dos incautos, independentemente de sinais de stop, estrada com prioridade ou mesmo de semáforos com o vermelho bem retinto. Claro que em estradas e cruzamentos não sinalizados, nem vale a pena falar.
Embora sejam umas bestas sem qualquer respeito pelos outros, se lhes dermos uma buzinadela de protesto, parece que lhes ofendemos a ascendência até ao criado do Afonso Henriques e vá de nos chamarem todos os palavrões que se lembram (embora mesmo nesse campo o seu vocabulário seja reduzido), quando não saiem do carro com ar ameaçador. Já passei por duas ou três situações destas, chegando mesmo a ser perseguido pela Bela Rosa abaixo por um jipe com dois morcões a quem não deixei passar quando vinha do lado do Vale da Amoreira e, à saída do viaduto sobre o caminho de ferro, eles me apareceram disparados do lado da Baixa da Banheira. A coisa acabou em bem porque este tipo de condutor só é bom com o pé no acelerador pois, desde que seja preciso usar um pouco de raciocínio, nem em marcha-atrás vão lá e cortei-lhes as voltas.
O argumento base daqueles com quem ainda é possível diálogo é: “Qual é o problema, veja lá se não me podia deixar passar ?”. A isso respondo que “Sim, realmente podia deixá-lo passar mas se a regra é a meu favor, eu só cedo a passagem se quiser.” Ao que me respondem aos berros, como se eu lhes estivesse a cortar um direito que é meu, segundo as regras. Se não concordam com as regras, podem sempre ir conduzir para Inglaterra, que se anda do lado esquerdo.
Este tipo de condutor reconhece-se facilmente pelo visual. Quando é adolescento borbulhoso, com a testosterona aos saltos, sem rapariga que lhe chegue perto, anda no carro de boné, com ar esgazeado e boca semi-aberta (a baba escorre-lhe a cada asneira que percebe ter feito); normalmente, nem tem carta e o carro não é seu. Quando começa a ser adulto (fisicamente, porque a nível mental nunca passou dos 3 anos e da fase retentiva anal), reconhece-se pela utilização dos óculos escuros (os mais imbecis usam-nos espelhados) e pela acumulação do gel nos apêndices capilares. Já tem carta e, mesmo se o carro é fraquito, gosta de fazer arranques à chico-esperto e pôr daqueles tubos de escape enormes, mesmo se o carro não passa dos 60 cavalos.
Em qualquer dos casos, são estas aberrações que tornam as nossa estradas mais mortíferas que Bagdad em dia animado e dos quais é necessário fugir mais depressa do que dum tsunami a seguir a um maremoto.
Claro que se tivéssemos forças policiais à altura, esta malta era apanhada, multada e, à segunda ou terceira, apreendida a carta e mesmo a viatura.
O problema, é que por cá toda a gente se esforça o mínimo, se acha mal paga e, no fundo, até se sente identificada com estes frustrados do alcatrão.
Façam-nos, por favor, a amabilidade de terem sexo de vez em quando para ver se podemos passar a conduzir sem ser com o coração nas mãos.
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