domingo, novembro 20, 2005

Uma Entrevista Imaginosa - Parte I

Eis o início da entrevista possível com o super-vereador da grande cidade Omita do Tejo de Cima, de seu nome Rio da Graça, um homem dos sete ofícios, especialista em todas as matérias da vereação, resultado de uma formação académica abrangente e especializada ao mesmo tempo.
Recebeu-nos com toda a cortesia no seu gabinete de trabalho, repleto de mapas, cartas, gráficos e outros materiais essenciais para melhor planear o progresso do concelho que dirige, desculpem, que ajuda a dirigir com uma visão modernista inigualável.

AV3, estagiário do AVP: Exmo Sr. Vereador Rio da Graça, muito bom dia, é uma verdadeira honra conhecê-lo, por fim...
Rio da Graça: Ora, não seja por isso. Deixe estar a vénia... não é necessário, é agradável e talvez merecido, mas deixe estar...
AV3: Não ? Mas o meu editor-chefe recomendou-me explicitamente que...
RG: Não ! Aquilo que combinámos ao telefone foi só uma brincadeira minha. Sabe... eu sou um homem com responsabilidades, mas tenho o meu humor. E o seu chefe insistiu tanto nesta entrevista exclusiva, que eu achei bem colocar algumas condições...
AV3: Ah bom ! Então passamos já para a sessão fotográfica ? Disse que gostaria de umas 10-12 fotos no nosso site e uma meia dúzia na versão impressa, não foi ?
RG: Não... deixe estar isso também. Poupemos tempo, o Boletim Oficial da Omita depois trata disso, eles já estão acostumados...
AV3 (quase imperceptível): Ufa...
RG: O quê ?
AV3: Nada, nada, estava aqui a dar a volta aos meus papéis...
RG: E, olhe lá, já agora, trouxe o questionário combinado com o seu chefe ?
AV3: Já que o senhor vereador, excelência, está de tão bom humor, pensei que até poderia fazer-lhe uma ou outra perguntada não planeada...
RG: Olhe que isso, já não sei... é que eu tenho aqui a maior parte das respostas já por escrito e depois, corta-se-me o raciocínio...
AV3: Vá lá, só uma sou duas...
RG: Está bem, se insiste assim tanto, chute lá isso.
AV3: Ora bem, Vamos lá começando por uma das perguntas combinadas. Vou começar a gravar. Senhor Vereagor da Graça, como consequiu atingir a actual posição de destaque e o seu invejável poder neste mundo difícil do Poder Local ?
RG: Meu amigo, pergunta muito bem pensada e que revela o interesse do nosso eleitorado. Enfim, sabe... Nada se consegue sem trabalho, muito trabalho, como diria o meu colega Octávio do Machado, acima de tudo com trabalho, muita abnegação, muito esforço, muita dedicação. E claro com muita humildade e apenas com o desejo de contribuir para o bem comum, para o desenvolvimento da comunidade, tudo isso. Como sabe, nunca tive qualquer ambição política.
AV3 (com algum espanto na voz): Não ?
RG: Não me interrompa, por favor. Como lhe dizia, nunca tive qualquer ambição política. Cheguei onde cheguei por mera casualidade. Nunca procurei nada. Limitei-me a mostrar o meu valor, a estar no lugar certo na hora certa. Nunca me pus em bicos de pés, nunca passei sobre ninguém. Tudo o que me aconteceu é o resultado natural do meu trabalho, a demonstração cabal de que o mérito é reconhecido pelos munícipes, de que a minha visão para o concelho é a certa.
AV3: Poderia concretizar a que trabalho se refere ?
RG: Mas isso estava previsto no questionário que me enviaram previamente ?
AV3: Não, mas como me falou no trabalho desenvolvido até chegar a vereador e agora a super-vereador, pensei que tivesse interesse em especificar....
RG: Não propriamente, meu amigo... acho que chega o que lhe afirmei, foi o meu trabalho e pronto.
AV3: mas, e desculpe insistir, refere-se ao trabalho político e aos artigos que produziu de forma esporádica na imprensa local a zurzir nos políticos de direita e em defesa do desenvolvimento sustentável, das questões ambientais...
RG: Sim, isso... também isso, mas olhe que eu gostava de seguir a nossa linha previamente definida para a entrevista.
AV3: Mas...
RG: Quer que eu telefone ao seu chefe ?
AV3 (encolhendo-se): Não propriamente, eu ainda sou um simples estagiário eventual, não é preciso incomodar-se...
RG: Mas veja lá...
AV3: pronto, está bem. Vamos então para um assunto que mereceu alguma discussão antes das eleições. O que acha do actual projecto de revisão do PDM, depois da discussão pública que...
RG: Qual discussão pública ? Eu não sei se autorizei isso !
AV3: Pois, lá isso...
RG. Mas eu falo do assunto. Não há problema. Ora muito bem. É um belo tema e uma bela questão como disse ao seu chefe. O PDM é uma peça essencial e estruturante para o desenvolvimento do nosso concelho, é uma ferramenta indispensável, uma alavanca necessária para a implementação do que julgo ser um projecto inovador, modernizador e mobilizador da nossa Omita como núcleo de uma nova centralidade na região em que nos integramos, pois irá permitir-nos funcionar como um pólo aglutinador e atractivo de toda uma nova população que para aqui se sentirá irresistivelmente atraída pelo valor milenar das nossas tradições e pelo carácter visionário do nosso projecto de futuro e de bem-estar à beira rio.
AV3: Mas de que forma isso vai ser feito, como prevê que seja possível atrair novas gentes para o concelho, atendendo às carências que ainda existem em termos de equipamentos colectivos, de...
RG: O quê ? Como ? O que é que acabou de dizer ? Quais carências ?
AV3 (engolindo em seco): Bem, eu, eu, eu...

(Continua)

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