segunda-feira, maio 01, 2006

Maio, Maduro Maio ?

De acordo com dados da própria CGTP, nunca um primeiro ano de governo foi tão poupado em matéria de contestação laboral como este, apesar de todo o aparato legislativo com que tem brindado os trabalhadores.
Não deixa de ser paradoxal que o executivo que mais firmemente avançou contra direitos, muitos deles adquiridos, dos trabalhadores seja o mais poupado em termos de movimentações de constestação tradicionais como as greves.
As razões para isso são diversas e vão do mais ou menos óbvio, de mudanças de táctica de luta até aos efeitos de compromissos tácitos no ano que passou através de boa parte da Esquerda, ou o que cá se auto-dennomina como tal.
Em primeiro lugar o óbvio: em tempos de crise e precaridade do emprego o recurso à greve pode ser mais prejudicial do que benéfico em matéria de manutenção dos postos de trabalho, assim como o aumento do desemprego acaba por funcionar a vérios níveis como elemento dissuassor das greves feitas sem uma base sólida.
Ainda do lado do óbvio: com a inflacção nos níveis actuais, pelos quais se determinam os aumentos salariais, um ou dois dias de greve podem ser mais penalizadores do que compensadores para os trabalhadores em termos de perdas materiais objectivas. Actualmente, fazer dois dias de greve - e perder a respectiva remuneração - não compensa um aumento de 0,5% no salário mensal. É só fazerem as contas, com base no peso percentual de cada dia de trabalho na massa salarial e perceberão rapidamente isto. Pelo vistos, nos sindicatos também alguém terá - finalmente - percebido que quando a inflacção era de 15-20% ou mesmo mais, as greves poderiam compensar pois eram margens de vários pontos percentuais que estavam em causa. Agora são décimas e é só fazer as contas e ver que há formas mais inteligentes de luta do que as greves.
Do lado do menos óbvio: se repararem estes valores tomam como base o período de Março/05 a Março 06 e realmente 83 greves é um valor bem baixinho para o arreganho habitual nos sindicalistas e em especial pelas bandas da CGTP, quando um governo entra em acção.
Só que este foi um ano especial, foi o ano pré-presidenciais em que à esquerda do PS ninguém se quis mostrar muito complicativo para ver se arranjavam uma estratégia concertada para eliminar o que era visto como um perigo, ou seja, Cavaco Silva na Presidência. Ninguém me convence de que não foi um certo passar da mão pelo lombo mútuo entre PS e PC, que permitiu que a CGTP andasse bastante calma, para o que é costume, em ano tão complicado.
A estratégia revelou-se atrozmente errada, pois a aposta em Soares como concorrente de Cavaco para uma segunda volta que agregasse toda a esquerda falhou de forma estrondosa e, no rescaldo disso, o Governo até andou bem calminho num ano que lhe poderia ter corrido bem pior.
Há situações perfeitamente inconcebíveis como, por exemplo na Função Pública, o facto de terem sido os juízes os mais contestatários às medidas em implementação no aparelho de Justiça, o ocultamento tácito de inúmeras irregularidades no concurso de docentes do ano anterior que os sindicatos não denunciaram (a "greve aos exames" queimou muita da já pouca credibilidade de Sucena e seus eternos camaradas) ou a relativa paz que viveu o sector da Saúde em absoluta derrapagem financeira, para não falar na diminuta contestação verificada no sector privado, se exceptuarmos a tentativa da tendência PC boicotar a acção da CT da Autoeuropa.
A verdade é que, apesar da retórica, Sócrates passou um ano de 2005 bem mais calmo do que seria de esperar, à boleia do engodo das Presidenciais.
E assim se passou um ano, em que os trabalhadores tiveram de lutar pela manutenção dos postos de trabalho, enquanto eles foram diminuindo e tornando-se cada vez mais precários.
E agora, por caricato que pareça, acaba por ser Cavaco Silva a erguer como primeira bandeira da sua presidência a questão da esclusão social e da pobreza, quando o "esquerdista" Sampaio esvoaçou sem resultados pelos apelos sobre a Justiça, o sistema político, a Educação, etc, etc.
Se a diminuição do nº de greves pode até ser uma boa notícia, a verdade é que as razões poderão não ter sido as melhores.

Zé Operário

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