sábado, fevereiro 24, 2007

Leonel Coelho, O eterno activista de Alhos Vedros


Recordamos aqui um artigo publicado no Jornal de Notícias 14/07/99, de Telma Roque, sobre Leonel Coelho o último dos comunistas românticos Alhos Vedrenses.

Leonel Coelho
mantém incólumes os seus ideais políticos e a fidelidade à velha Academia 8 de Janeiro.


Irreverente, choramingão, voluntarioso e fiel às suas convicções. São as palavras que melhor definem Leonel Coelho, o carismático alhosvedrense, militante do MRPP, escritor, poeta, actor e associativista.
Na verdade, Leonel Coelho nasceu na Beira Baixa, em 1933, entre duas guerras mundiais. Ainda se lembrade sentir o cheiro dos cadáveres espanhóis, derrubados na Guerra Civil, mesmo ali ao lado. Costuma dizer que com o pai aprendeu a assobiar, «com a prisão o preço da liberdade, com a PIDE o silêncio e com os humildes a simplicidade».
Depois de uma passagem pelo Montijo, decide entrar na Marinha, nos anos 50.
Mas não se aguentou muito tempo, porque foi sempre um rebelde. «Sou normalmente expulso de todo o lado», diz o homem que deu os primeiros passos na actividade política justamente nessa época. Era então trabalhador na barragem de Belver, participando com os seus camaradas de trabalho numa jornada de protesto pela reposição de salários, uma acção que acabou com o
cerco da GNR.

Seis meses de «vaquinhas»
Como operário da CUF, fez parte da Comissão Interna, eleito por sufrágio dos trabalhadores em dois mandatos consecutivos, culminando com o despedimento em 1966. Na altura, a fábrica tinha mais de 5500 funcionários, só na zona têxtil, e cerca de cinco centenas de teares.
Entre Agosto de 1966 e Janeiro do ano seguinte, por ter tido a ousadia de ir a Lisboa pedir uma espécie de aumento, em representação dos trabalhadores, Leonel Coelho é obrigado a viver da solidariedade dos colegas. No final de cada mês, após uma «vaquinha», o seu ordenado chegava a casa «todo certinho».
Aproveitou os escassos anos na CUF para integrar o Grupo de Teatro da fábrica. Participou, por exemplo, na peça «Os Três Ratos Cegos», de Agatha Christie, e em «O Segredo da Abelha», de Ricardo Alberti.
Como escritor, editou «Como quem assobia» e «Com todos aprendi», sendo também co-autor das obras «Zeca Afonso Presente» e «Poetas Nossos Munícipes».
Por esta altura, já tinha «ancorado» em Alhos Vedros. Lembra que a indústria corticeira estava no seu apogeu. «Já os moinhos do Salvador e do Xarroqueira eram passado. O do Salvador protagonizava a maior vaga de prisões num só dia, realizada pela famigerada PIDE. Quatro dezenas de corticeiros são levados para o Aljube, povoando Peniche e Caxias».

Fosso entre ricos e pobres
Além disso, «as tabernas proliferavam, apoiando o slogan salazarista «beber vinho é dar de comer a um milhão de portugueses». Todo o entretenimento, com excepção do futebol e do cinema, «resumia-se à sueca e à bisca».
Na época em que o analfabetismo era moda, conta que «os ricos jogavam ao burro nas suas coutadas, movimentando altas paradas, iam à missa e aliciavam a criadagem». Sendo assim, enquanto os pobres trabalhavam e bebiam, «os ricos multavam, amedrontavam, submetiam, humilhavam e espancavam».
A vida de Leonel Coelho mistura-se então com a da Academia 8 de Janeiro, quase tão velha como ele próprio. Durante anos, teve uma banda filarmónica, foi proprietária do desaparecido Cinema de Alhos Vedros e dinamizou o basquetebol.
Apesar disso, mantém ainda a sua famosa Feira do Livro, consultas médicas, escola infantil, ténis de mesa federado, ginástica e uma romagem anual à campa de Zeca Afonso.

Crónico candidato
Na sua óptica, o 25 de Abril trouxe esperanças «mas acomodou-se». Logo após a Revolução, comenta, «a prepotência, a construção civil, as confecções e o betão, dão as últimas machadadas no sal, no pão e na cortiça».

Avança que, actualmente, perdeu-se o sabor das coisas.

«A novidade já não é novidade. O pão agora é de leite, o bife é hamburguer e a fruta é calibrada».

Por tudo isto, considera que tem uma palavra a dizer na política local.
Apresentou já, por diversas vezes, a candidatura pelo MRPP à Junta de Freguesia de Alhos Vedros. E fá-lo sempre, de quatro em quatro anos, à Câmara da Moita.

É um crítico da União Europeia. Costuma dizer que «foi a Europa que entrou por Portugal dentro» e não o contrário. Avança ao JN que, se um dia ganhasse as autárquicas, a primeira medida que tomava «era queimar as portas da Câmara Municipal» e tomar precauções mais eficazes na defesa do ambiente do concelho. Porque «cada vez há menos andorinhas»....

2 comentários:

Anónimo disse...

Leonel Coelho é um Homem com "H" grande.
Conduz um calhambeque fraco, mas é um Homem.
Há outros que andam montados em carros bem mais vistosos, e até bons carros, mas que se comportam como ratos.
O veículo conta pouco, face ao peso verdadeiro das pessoas.

Anónimo disse...

Sexta à noite, Biblioteca de Alhos Vedros, entre as 21H30 e as 23, mais coisa menos coisa, foi um espectaculo.
Rever, mentalmente, as "palavras de ordem" de à 30 anos, que continuam as mesmas...enfim, Leonel Coelho tem muito valor, sem duvida, mas está um pouco parado no tempo.