Num comentário inserido há uns dias atrás no nosso blog, Titta Maurício alertava para uma questão muito importante em torno das movimentações que actualmente se fazem nos bastidores da campanha eleitoral
Por muito que nos separem as nossas convicções pessoais, penso que o alerta se justifica e espero que seja sincero, não oscilando com os agentes e as circunstâncias políticas do momento.
Escrevia TM sobre os encontros de topo entre as chefias do PS e do grupo Impresa, indiciadores (acrescento agora eu de forma explícita) de conluios ocultos que se estarão a preparar para o pós- 20 de Fevereiro entre os socialistas que puseram Sócrates como seu testa-de-ferro e o grupo dominado por Balsemão.
Conhecendo-se os antecedentes do relacionamento entre grupos empresariais, e em especial de comunicação social, e o poder político este não é um problema de somenos.
São públicas as manobras dos governos anteriores em torno da comunicação social; com Barroso/Portas foi o grupo PT/Lusomundo a servir de campo de ensaio para a colocação de aparelhistas e fiéis do governo (será que ouvi alguém dizer Luís Delgado ?), enquanto com Lopes/Portas foi aquela inábil manobra com o grupo Media Capital.
Se recuarmos um pouco mais, é fácil constatar que em algumas eleições o posicionamento implícito dos principais órgãos de informação (SIC, TVI, Expresso, Público, Visão, Diário de Notícias, Jornal de Notícias) foi determinante para a mudança eleitoral. Cavaco durou até onde quis mas, em parte, até onde o seu braço-de-ferro com a comunicação social resistiu, pois desde 1993 que estava claramente sob ataque da imprensa e a derrota do PSD de Nogueira em 1995 é em muito facilitada pela “má imprensa” em seu redor.
O mesmo se passaria com Guterres que, no seu segundo governo, foi fustigado desde cedo pela opinião publicada e pela forma como se puseram a nu as insuficiências que já vinham de trás.
Com Barroso, as coisas amainaram porque todos estavam à espera de saber para onde caíriam as simpatias do poder político em alguns negócios que se aproximavam e, apesar de sobressaltos, não se deu uma clara “barragem de fogo” nos seus dois primeiros anos (em torno do Paulo Portas o caso foi outro, mas nada pior do que o que o próprio fez no Independente). Ora, tudo isso acabou com Santana Lopes, velho conhecido de toda a gente no meio, que lhe nutre pouca admiração pelo eventual carisma que algum eleitorado lhe encontra. Acrescendo a isso, a profunda inabilidade de Santana para liderar um Governo e a sua desastrada tentativa de estabelecer alianças com parte do mundo da comunicação social, levou ao levantamento de alguns adversários poderosos que, à falta de melhor, se viram agora para Sócrates.
Assim se explica, por exemplo, que nas últimas semanas a primeira página do Expresso se tenha tornado o anti-Povo Livre com uma sucessão de destaques que se centram quase por completo em diferendos internos do PSD e na divulgação das asneiras e falta de coerência de Santana Lopes. O máximo desta distorção passou-se com a edição em que o quase único destaque era dado a um eventual engano de António Borges (figura que de tanto se oferecer para qualquer coisa, deve ter qualquer problema de fabrico) por Santana quanto a ofertas de cargos no Governo e na CGD.
A vida política resume-se, para a primeira página do Expresso, às asneiras de Santana, enquanto nada se diz sobre Sócrates (planando sobre algumas das suas evidentes insuficiências) e tratando os partidos mais à esquerda como não-entidades merecedoras de notícias ou seleccionando cirurgicamente os opinadores de serviço.
O plano é óbvio: derrotar claramente PSD e CDS (potenciais aliados da Media Capital) e levar o PS ao colo até à maioria absoluta, para que o PCP ou o BE não possam bisbilhotar o que se passa por debaixo da mesa.
Por isso, reafirmo a minha desconfiança genética quanto às maiorias absolutas e à bondade dos apelos à estabilidade governativa monopartidária.
Na prática, o que se pretende são menos parceiros à mesa dos negócios e, se possível, afastar quem não dê garantias de bico calado.
Por isso mesmo, e graças a muito boa gente colocada em pontos-chave em muitas redacções, para muita imprensa, em caso de maioria relativa do PS, é muito mais simpático colocar o Bloco de Esquerda na esfera do poder do que um PCP puro e duro. Porque, como esquerda moderna e mediática que são, os poucos que mandam a sério no BE serão muito mais fáceis de contentar, tendo já a maior parte deles ganho lugar cativo em órgãos de comunicação social (ou pensam que o assessor de imprensa do BE, Daniel Oliveira, passou a estar na SIC-Notícias e no Expresso por acaso ?).
Claro que, para o vulgo, tudo isto passa desapercebido ou, para usar as palavras de José Gil, é visto como se vivessemos num permanente nevoeiro.
António da Costa, 1 de Fevereiro
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