sexta-feira, maio 27, 2005

A Cóltura, esse bicho escaraminhão

Esta semana tenho estado com familiares em casa, pelo que em parte fiz papel de cicerone das maravilhas das redondezas, desde as abundantes ofertas comerciais – Fóruns e afins, mais o Freeport – até às ainda abundantes, mas nem sempre bem aproveitadas potencialidades patimoniais, naturais e históricas.
Claro que quando se faz algo deste género se perde pouco tempo no concelho da Moita, pois o que há ainda para ver é mínimo e faz-se em pouco tempo – Matriz de Alhos Vedros, Pelourinho, Misericórdia fechada, enfim...
É necessário partir para outra paragens... Arrábida, Setúbal, Palmela e ir arejar até ao Alentejo.
Ora bem, ontem foi dia de castelo de Palmela e zona circundante.
Já há algum tempo que não contactava directamente com o trabalho editorial da CMP, mas o posto de Turismo do castelo permitiu-me encontrar abundante material, desde pequenos desdobráveis sobre o património local até guias sobre a gastronomia e a oferta local no plano turístico, passando por uma já razoável produção de monografias sobre localidades da região, do Poceirão à Quinta do Anjo, passando pela ligação do Pinhal Novo aos caminhos de ferro, mais os volumes dedicados aos Encontros sobre as Ordens Militares. Entre colaboradores e autores encontra-se principalmente pessoas de fora dos serviços camarários, mas conhecedores da realidade local. Ou seja, as publicações não parecem apenas capelinhas protegidas, mesmo se são naturais certas preferências.
Quanta diferença em relação ao que nos rodeia.
Monografias capazes sobre as terras do concelho da Moita pura e simplesmente não existem, para além do que é mais óbvio – assinalar o foral manuelino de Alhos Vedros ou a elevação da Moita a vila e pouco mais. Para além disso, diversas das monografias revelam um visível amadorismo na concepção e execução.
Enquanto Palmela aproveitou a herança da Ordem de Santiago para promover um pólo regular de debate, com os Ensontros sobre as Ordens Militares (a que nunca assisti porque não aprecio muito o tema), a Moita foi incapaz de rendibilizar o facto de ser a Misericórdia de Alhos Vedros uma das cinco ou seis mais antigas do país para dinamizar iniciativas em seu torno.
Em boa verdade, a Capela da Misericórdia podia cair que duvido que alguém na CMM se preocupasse muita com a coisa ou achasse perda de maior. Em contrapartida, sucederam-se colóquios sobre temáticas que, embora interessantes, muitas vezes não preenchem as imensas lacunas que existem nos estudos locais, mesmo se preenchem os interesses de quem os promove na autarquia.
Mesmo a recente e oportunista colagem ao lobby taurino parece uma ideia do momento, desgarrada e principalmente motivada por interesses eleitoralistas.
Ou seja, parece existir uma ausência de rumo, de ideia orientadora a médio prazo, apenas se gerindo o curto prazo e a iniciativa isolada ou de interesse particular.
Claro que não é isso que acontece em outras autarquias do distrito que, há pelo menos duas décadas (a citada Palmela, mas também o Seixal e Almada) desenvolveram políticas culturais e de juventude que ultrapassam o evento metaleiro, o fechar de olhos ao tunning nas instalações de uma Escola, a implantaçao de umas esculturas em rotundas sem qualquer enquadramento paisagístico ou as quinzenas de programa repetitivo.
Claro que isto só pode acontecer quando a Cultura é gerida, sucessivamente, por pessoal político sem qualquer apetência ou aptidão para esta área e a confunde com outras coisas.
Claro que isto só acontece quando na escala das prioridades autárquicas a Cultura vem muito atrás do Progresso, sendo este “Progresso” o betão e o alcatrão.
Claro que isto só acontece porque a Cultura é uma coisa chata e, fazendo-se um Fórum Cultural em várias décadas de poder, parece ter-se feito tudo, esquecendo-se que o essencial é uma linha programática coerente e consistente, que não pode ser repescada apenas quando interessa e evocada num par de linhas dos programas eleitorais.
E não seria muito difícil aprender com os exemplos existentes, no mesmo distrito e desenvolvidos pela mesma força política.

AV1

Nota final: Dito isto, convém dizer que, pelo menos, aprecio bastante o boletim Maré Cheia, mas penso que mais pela concepção gráfica do que algumas vezes pelo conteúdo.

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