domingo, maio 01, 2005

Bloguices III

Em reunião de trabalho da passada 6ª feira, um editor frente a uma bela torta cheia de creme e o outro, mais conscencioso, frente a uma águinha mineral, chegou-se à conclusão que o espírito satírico, caótico e libertário dos tempos iniciais deste blog tem vindo a decair e a dar lugar a uma desnecessária e nem sempre útil seriedade e ponderação no discurso e na nossa atitude.
A principal razão para isso terá passado, em grande medida, por nos começarmos a tomar demasiado a sério e a ceder a alguns "empurrões" (mesmo que bem-intencionados) de alguns leitores ou a acharmos que devemos excessivas (auto-) justificações a outros leitores(as) mais agrestes nos seus comentários e acusações.
Para os raríssimos leitores dos primeiros tempos de 2003, o AVP está quase irreconhecível e se isso se deve a um relativo "enriquecimento" de conteúdo do blog, também se fica a dever a um "empobrecimento" da veia jocosa que nos motivou em primeiro lugar.
Ao elaborarmos os textos para esta sequência "Bloguices", em especial ao escrever o final do anterior, percebemos quanto nos fomos deixando arrastar para o centro da corrente e o quanto fomos ficando mais sensíveis aos reparos e críticas dos que nos pretendem ver mais construtivos, formais e mais iguais à norma.
Nos primeiros meses o AVP era formado apenas por textos com pretensões satíricas - conseguidas ou não - dirigidas contra o "poder moiteiro", usado como metáfora do mau exercício do poder político no nosso país. O nosso propósito era, antes de mais, puxar pela auto-estima alhosvedrense, neste caso encarada como uma metáfora daquele país que foi ficando para trás, maltratado ao longo das décadas pela incompetência e mau-gosto daquele poder.
Em primeiro lugar, desejávamos rir-nos do que nos rodeava e escrever sobre isso. Não nos importávamos com audiências, opiniões alheias, etc, etc...
Quando visámos alguém a nível pessoal, informámo-los das nossas críticas (daí o velho conhecimento com o leitor TM).
Com o tempo, e devido ao contágio da leitura de outros blogs, ditos "de referência" começámos a achar que podíamos fazer "mais e melhor". Ao fim de mais de um ano, começámos por testar a inserção de imagens, surgundo aí a aideia de tornar o blog uma espécie de magazine dos nossos gostos particulares - música, cinema, literatura, ensaio, bd.
Começámos em seguida a incluir contadores e a permitir comentários directos ("prendas de Natal" de 2004) e a darmos mais atenção ao que pensavam de nós. O contexto político do governo Santana/Portas foi demasiado tentador e alargámos a nossa esfera de comentário.
Começámos a querer não só desagradar, mas também agradar, a olhar para o nível de visitas, de comentários, a justificarmos o que escrevíamos, a tentar mostrarmos como o que pensamos não é assim tão disparatado.
E, por via de regra, é aí que começa a morte do artista, como se comprova pelo "tio Herman".
Num autêntico acto de contrição, sexta-feira passada decidimos fazer, na medida do possível, um back to the basics e retornar o AVP aos seus intuitos originais.
Embora mantendo o gosto pelo carácter magazinesco do blog (os Suplementos Dominicais, as colunas de sugestões, as reportagens fotográficas) e não recusando meter a foice pela seara do debate sério das questões, vamos voltar a colocar o ênfase na sátira dos (maus) costumes que nos bulem quotidianamente com os nervos, seja isso do agrado - ou não - de parte dos nossos leitores.
O intuito da criação deste blog foi divertirmo-nos e não promovermo-nos; foi criticar a situação, não tomar-lhe o lugar.
De tanto criticarmos a ausência de alternativas ao "poder moiteiro" (que poucos terão percebido que não é só o poder da CMM, mas sim o de todos que o emulam), a certa altura até parece que queríamos ser essa alternativa.
De tanto criticarmos a inacção, ou a inoperância, de quem tem a efectiva responsabilidade de fomentar o desenvolvimento de Alhos Vedros, pudemos dar a sensação que querermos nós arcar com essa responsabilidade.
E a verdade, é que não é bem assim.
A verdade é que aqui ninguém quer tomar o lugar de ninguém, podem ficar descansados.
Mas também é verdade que aqui ninguém quer deixar de criticar o que bem nos apeteça.
Sem compromissos de ordem alguma.
E sem formatações ao gosto dominante.
Não queremos ser iguais, nem dar mais do mesmo, porque para isso há muitos candidatos.

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