sábado, maio 07, 2005

Mandatos e Limitações (II)

Conforme prometido, e apesar da preguiça em pensar e digitar de forma coerente ve não disléxica, aqui fica a segunda parte de uma curta reflexão sobre a necessidade de controlar o exercício prolongado de funções políticas:

2. A limitação do exercício de cargos políticos depara-se fundamentalmente com um argumento, na aparência de peso, que é o de não se dever limitar artificialmente os direitos dos cidadãos em serem eleitos ou em elegerem que considerem mais competente, seja por que período de tempo for.
Teoricamente, este é um argumento legítimo pois esgrime que devem ser os cidadãos com o seu voto, e não a lei, a determinarem a rotatividade dos ocupantes desses cargos.
No entanto, este argumento da legitimidade democrática dos eleitos confronta-se, contudo, com algumas questões que na prática pervertem de forma bem perniciosa a sua bondade.
Antes de mais, e como réplica de fundo no plano teórico, devemos recordar sobre a limitação artificial da liberdade dos cidadãos que mesmo o documento fundamental que a garante nos regimes democráticos de tipo ocidental – a Constituição – é um contrato social e político que mais não faz do que codificar essas mesmas limitações quando enumera os direitos e deveres de cada um de nós e quando explica de que forma a soberania que reside no “povo” é transferida para os seus “representantes” eleitos.
Mas passemos antes a questões práticas e concretas.
A afirmação de que são os eleitores quem deve determinar quem ocupa os cargos políticos é falacciosa e assenta numa mistificação porque, na prática, aos cidadãos é apresentado um leque limitado de escolhas e previamente filtrado pelas estruturas partidárias que determinam quem se candidata e ao quê. Sejamos francos, nós não votamos em quem queremos, mas no melhor (quantas vezes no menos mau...) do que nos é apresentado. É como ir ao restaurante e, perante tudo o que não há, acabarmos por escolher o que nos desagrada menos da ementa disponível. Com a agravante de, no caso das autárquicas, ser mais difícil mudar de estabelecimento (não se pode estar sempre a mudar de sítio para viver...).
Não nos iludamos – em especial a nível autárquico que é o que agora nos interessa mais – com a possibilidade de candidaturas independentes. A experiência recente demonstra que essas candidaturas ditas “independentes” só vingam e têm possibilidades de se apresentarem ao eleitorado com um mínimo de possibilidades, se partirem de uma posição de Poder – quando um presidente de Câmara ou um notável local entra em rota de colisão com o seu Partido e se candidata fora do espectro partidário (caso de Daniel Campelo, na sequência da aprovação do “Orçamento Limiano”) – ou quando se coloca, por conveniência mais do que por convicção, sob a “sombrinha” de uma sigla partidária (caso da única câmara do MPT no país ou daquela Presidente que se transferiu do PCP para o Bloco de armas, bagagens e ampla cobertura da comunicação social..
Candidaturas independentes são virtualmente impossíveis de se apresentar como competiticas, enquanto movimento de base, porque precisam de enfrentar, sem armas, em situação muito desfavorável, as estruturas e os enteresses instalados, não tendo acesso fácil a meios eficazes para a difusão das suas mensagens, a menos que se aliem a alguns desses mesmos interesses, se possível a alguns que tenham capacidade económica.
Infelizmente, a renovação das práticas perversas de eternização de determinados indivíduos ou grupos no poder, passa ainda essencialmente pelo funcionamento interno dos aparelhos partidários, o qual é quase sempre ainda mais sufocante no plano local do que no nacional, em virtude das escassez de alternativas em termos humanos e da extrema proximidade do combate político pela manutenção das posições alcançadas (veja-se o que se passou em Matosinhos). Por outro lado, a renovação nem sempre (nem necessariamente) passa pela rotação dos nomes nas cadeiras, mas passa principalmente pela mudança nas práticas.
Neste contexto, um projecto de renovação da prática política “por dentro” do sistema partidário só se revela possível a médio/longo prazo e avançando com pequenos passos, muitas vezes impostos de cima para baixo, com graves custos (veja-se a situação do PSD em Oeiras e Gondomar).
A nível local, a vida político-partidária é um microcosmos dos defeitos (e confiemos que também das virtudes) da pobre vida política nacional, com as agravantes, algumas já antes enumeradas, da maior escassez de pesssoal político competente e sério, da extrema virulência das lutas internas pelo controle do(s) poder(es) disponível(eis) e da tendência para pactuar com estratagemas para-legais ou mesmo ilegais em nome da defesa do “interesse local” (caso de Felgueiras).

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