José António Cerejo
Mesmo que nada se venha a construir no local, os proprietários conseguirão milhões em indemnizações
A proposta de revisão do Plano Director Municipal (PDM) da Moita, já aprovada pela câmara local e pela administração central, prevê a urbanização de uma quinta de 27 hectares que está classificada como Reserva Ecológica Nacional (REN) e se situa no meio do canal reservado aos acessos à futura ponte Chelas-Barreiro e à passagem do TGV. A delimitação deste canal foi feita por um decreto publicado em Maio de 1995, mais de um ano antes do início da revisão do PDM do concelho.
A situação tem semelhanças com a da antiga Fábrica Nacional de Sabões, em Marvila, mas é provavelmente mais grave, na medida em que, na Moita, além de se tratar de um espaço da REN, a viabilidade do loteamento só começou a ser trabalhada depois da publicação do Decreto 17/95, que delimita a "zona de defesa e controlo urbanos" da terceira travessia do Tejo.
A atender ao texto desse diploma - que pretendia contrariar "as previsíveis pressões urbanísticas e especulativas" que viessem a dificultar o projecto -, a criação do corredor de acesso à ponte devia, desde logo, "ser tida em consideração nos trabalhos de elaboração dos planos municipais que incidam sobre a área em questão". A verdade, contudo, é que isso não aconteceu na Moita. E embora a câmara não pudesse deixar de conhecer a existência da "zona de defesa e controlo urbanos", estabelecida naquele decreto, a urbanização das Fontainhas foi assumida como um objectivo da reformulação do plano. Ocupada desde há muito por uma vacaria e situada entre o núcleo urbano do Vale da Amoreira e o IC21 - a via rápida que liga o Barreiro à Auto-estrada do Sul -, a quinta avultava no corredor reservado à futura travessia como a única grande mancha não construída e pertencente a um só proprietário. Mas estando classificada como REN e incluída no corredor da ponte desde 1995, o seu valor era muito baixo, tanto mais que até a sua actividade pecuária estava condenada, face à sua inserção em meio urbano.
Conhecedora de tudo isto e da intenção camarária de viabilizar a urbanização daquele espaço, a imobiliária Imomoita, pertencente a dois dos principais empresários da construção civil do distrito de Setúbal, Emídio Catum e Teodoro Alho, tratou de garantir a consolidação da vontade municipal antes de comprar os 27 hectares das Fontainhas, em Abril de 2000. Para isso negociou com o município, através do consultor jurídico da autarquia, Rui Encarnação, um protocolo que viria a ser assinado no final daquele ano e no qual a câmara, face à disponibilidade da Imomoita para lhe ceder gratuitamente diversos terrenos noutros locais, declarava formalmente a sua intenção de classificar a propriedade, no âmbito da revisão do PDM, como "solo urbano de finalidades habitacionais, comércio e serviços". O texto do acordo acrescentava que o índice de construção a autorizar futuramente na quinta seria de 0.7, o que permitiria construir ali mais de 190 mil m2, equivalentes a 1900 apartamentos de 100 m2 cada.
Revisão do PDM ignora canal para a ponte.
Com a garantia de que a câmara queria viabilizar a sua urbanização, a empresa avançou para a compra dos terrenos, sendo o negócio fechado com o apoio do escritório particular de Rui Encarnação - o consultor camarário para quem uma outra empresa de Emídio Catum estava a construir uma luxuosa moradia no concelho (ver PÚBLICO de 28/01/07). Questionado há algumas semanas sobre o valor pago, Emídio Catum disse que "devem ter sido uns cinco milhões de euros", embora não se recordasse do valor exacto. De acordo com a escritura, no entanto, a quinta custou cinco milhões de contos [cerca de 25 milhões de euros], valor que os conhecedores do mercado dizem ser impensável para uma propriedade situada na REN e incluída no corredor da futura ponte. Ao que dizem alguns vizinhos, porém, o antigo proprietário, Tomás Cruz, não terá recebido mais do que 1,5 milhões de euros, o que até seria muito face às condicionantes. O vendedor, por seu lado, recusa-se a falar sobre o assunto, alegando que se encontra muito doente. A esposa, que também interveio na escritura, limita-se a responder: "Pergunte ao comprador."
Os sócios da Imomoita criaram entretanto ilegalmente uma cooperativa de habitação, a Parcoop, à qual venderam a quinta por 26,7 milhões de euros em 2003. E a versão final do projecto de revisão do PDM, aprovado pela câmara e pela comissão técnica de acompanhamento, onde tem lugar a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), contemplou as Fontainhas com a supressão da REN e com a classificação de mais de dois terços da sua área como espaços susceptíveis de serem urbanizados, sem que o corredor da ponte se vislumbre na planta de ordenamento.
No passado dia 25 de Janeiro, um novo decreto substitui o 17/95 e confirma o canal reservado à ponte e ao TGV, tornando-se praticamente certo que nada, ou muito pouco, do que está no protocolo e no projecto de revisão do PDM irá por diante. Falta saber até que ponto os direitos indemnizatórios da Imomoita/Parcoop se multiplicaram em todo este processo, com o apoio da câmara e da CCDR.
2 comentários:
Este sim é o negócio da China.
Os tiposde Lisboa, Gondomar, Felgueiras, Marco Canavezes, Funchal, Napoli, Little Italy, Chicago, Nigeria, Mensalão, Fragatas francesas para Taiwan, etc, e tal ... são uns nabos e uns aprendizes.
Na Moita é que está dar... e os de cá sabem-na toda.
E depois... com uns amiguinhos na CCDR-LVT, na Comissão Nacional de REN, no Iinst Estradas de Portugal e na REfer, mais outros na Direcção do PCP e no PEV, é a 200 à hora e sempre a abrir.
...
Finalmente a Moita está no Mapa!
Viva!
(obs.: mau, 'malíssimo' mesmo, é que seja pelos piores motivos)
Tpc:
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Intervenção do Presidente da República na Cerimónia das Comemorações dos 96 anos da Proclamação da República
Lisboa, 5 de Outubro de 2006
in
http://www.presidencia.pt/?id_categoria=21&id_item=1685
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